A Revista “O Mundo Ilustrado”, em 1958, publicou uma Edição Especial de Aniversário da Revolução Constitucionalista com várias entrevista, artigos e fotografias. Fiz a transcrição da publicação, “Três Depoimentos sobre 32”, com a entrevista de três personalidades, as quais vivenciaram ativamente o movimento de 1932, textos de Isa Leal:
ALTINO ARANTES.
Altino Arantes fala da unanimidade do sentimento paulista, em 32.
“Foi a semente que, regada pelo sangue de tantos, restituiu ao país a Constituição Política”.
“Manchete pitoresca de um jornal da ditadura chamava a atenção para a foto dos exilados”.
Quem conhece bem São Paulo e seu escol de homens de pensamento sabe que o ex-presidente do Estado, Altino Arantes, atual presidente da Academia de Letras Paulista, é, além de orador elegante, de cultor da língua, um homem de sociedade, cavalheiro como poucos. Em sua residência que guarda tanta recordação de um passado que, nas últimas quatro décadas, foi também o de São Paulo, Altino Arantes nos recebe com sua proverbial cortesia. Fala-nos do que mais o impressionou, durante a Revolução Constitucionalista: - Para os paulistas que amam verdadeiramente a sua terra e se gloriam das suas tradições, é sempre grato recordar a página de patriotismo e de bravura que eles escreveram no movimento revolucionário de 1932. Nesse movimento, o que até hoje nos aparece como mais admirável e mais edificante é a unanimidade de votos e sentimentos que fez da população de São Paulo um só peito e um só braço para lutarem por aquilo que então lhes parecia e era realmente a maior e a mais urgente aspiração da pátria: a reconquista das liberdades constitucionais que a ditadura triunfante lhes usurpara e teimava em conservar.
“Não foi inútil: São Paulo realizou sua missão histórica de combater pela prosperidade da Nação”.
Contínua o líder da Revolução Constitucionalista, agora respondendo à nossa pergunta sobre as consequências boas ou más daquele movimento: - Esse esforço coletivo e unânime, embora tivesse sido suplantado pelo poderio das armas que contra ele se congregaram, não foi entretanto inútil: foi a semente que se lançou no solo da nossa terra e que regada e fecundada pelo sangue de tantos que por ele morreram, logrou afinal restituir ao país a Constituição Política pela qual São Paulo lutara, realizando ainda neste glorioso episódio a sua missão histórica de combater e vencer pela prosperidade da Nação brasileira.
Sobre o exílio: “Portugal foi a terra que nos sobrou quando a nossa faltava.”
Comenta agora o ilustre batalhador de 32 a decisão da ditadura de afastar alguns dos líderes daquele movimento: - A ditadura, então triunfante, castigou os paulistas que contra ela lutaram, com o exílio para Portugal, exílio esse que a bondade dos portugueses timbrou em tornar o mais suave possível, oferecendo-nos hospitalidade franca e carinhosa que eu mesmo, referindo-me a ela, tive a oportunidade de afirmar com verdade que, naquela dolorosa emergência, para nós Portugal foi realmente a terra que nos sobrou, quando a nossa nos faltava. E, encerrando sua entrevista, o prócer constitucionalista de 32 nos fala sobre a manchete com que o jornal da ditadura, do Rio, chamava a atenção para as fotografias dos exilados do momento. Ri-se o acadêmico, vale a pena ver seu bom humor, ao repetir a manchete: - “Fora com eles!” Mas não sabemos se o caso é para rir do que de chorar, quando uma ditadura de qualquer espécie elimina sumariamente da vida pública os homens que formaram verdadeiramente a sua elite.
Aureliano Leite.
Aureliano Leite, hóspede de todas as prisões políticas do Brasil duas vezes julgado pelo Tribunal de Segurança.
“A Revolução de 32 não foi de todo inútil”.
Testemunho sobre o pretenso “comunismo de Monteiro Lobato”.
O ditador não permitiu que ele voltasse para ver sua mãe morrer
O bom humor acadêmico e uma manchete.
Uma das figuras mais combativas e de maior projeção do movimento de 32 foi Aureliano Leite. No dia 24 de maio, no Clube Comercial, do qual era então Presidente firmou-se um documento secreto, que assim permaneceria durante algumas semanas, para se tornar público somente a 10 de julho. Fundou-se, nesse 24 de maio, o MMDC, que seria, dois meses depois, o mais altíssimo brado de revolta, o símbolo de todos os anseios paulistas. O escritor Aureliano Leite, que é o autor de numerosas obras sobre a história de São Paulo, naquele momento, não se contentou com escreve-las. Viveu-a. Para tanto, esteve em todos os setores da luta: a palavra e a ação se completaram. Entrevistamos Aureliano Leite, em seu escritório, onde uma janela domina parte da cidade. De vez em quando volta amorosamente o olhar para ela. Fala-nos de sua participação no movimento de 32: - Estive um ano no exílio, como quase todos os companheiros, entre os quais posso citar os nomes de Álvaro de Carvalho ( que morreu no exílio), Altino Arantes, Valdemar Ferreira, Francisco Mesquita Filho, Luís Pisa Sobrinho, Ataliba Leonel, Tirso Martins, muitos militares, entre os quais os Generais Isidoro Dias Lopes e Klinger, alguns Coronéis, como Euclides Figueiredo, e ainda gente de fora de São Paulo, como Artur Bernardes, Austrégesilo de Ataíde, Teodomiro Carneiro Santiago, Borges de Medeiros. Fui julgado duas vezes pelo Tribunal de Segurança.
“Minha mãe morreu, olhando para a porta, à minha espera...”
O escritor estava exilado, quando sua mãe ficou muito mal, implorando à família que queria vê-lo. Todos lhe diziam que ele não demorava, que estava a caminho, que chegaria a qualquer momento... A piedosa mentira manteve suas energias durante algum tempo. Depois, não resistindo, fechou os olhos que viviam continuamente pregados na porta, por onde chegaria o filho... O ditador não permitira que um filho desse à sua mãe o último consolo do seu beijo. Aureliano Leite conta-nos ainda: - Outro motivo pelo qual me foi especialmente penoso o exílio foi o de ter deixado aqui, sendo já viúvo, minha filhinha, que então contava quatro anos de idade.
Testemunho sobre Lobato.
O escritor dá-nos então um curioso testemunho. Dos lábios de Monteiro Lobato ouviu, certo dia, um pouco àquela maneira de “boutade” permanente que era a do criador de “Urupês”, a explicação do seu pretenso comunismo. Lobato desejava que o Brasil caísse nas mãos dos comunistas durante algum tempo, pois, dizia ele, tinha a certeza de que o povo não o aceitaria muito longamente. E, durante esse tempo – se não houvesse também uma intervenção estrangeira – os comunistas dariam um banho de sangue no Brasil, eliminando possivelmente quaisquer elementos perniciosos da nossa política. Como todo vaticínio, este é dos mais arriscados. Aureliano Leite nos conta a opinião de Lobato, com a intensão, exclusivamente, de esclarecer que seu “comunismo” nunca passou de “boutade” – e do desejo patriótico de ver o Brasil livre de indesejáveis influências. Nosso entrevistado responde à pergunta sobre os resultados positivos que possamos ter alcançado com o sacrifício do sangue feito em 32: - Não foi de todo inútil. Temos no momento certa liberdade de pensamento. Entretanto, não posso deixar de reconhecer que o momento é dos mais perigosos para o Brasil, em que pompeiam figuras das mais negregadas que o país jamais teve em sua história política.
Júlio de Mesquita Filho.
Este homem sereno que entrevistamos, no salão nobre do Jornal “O Estado de São Paulo”, é o chefe de um império. Sob sua ordem, há centenas de pessoas, Império democrático por excelência. Ele nos declara, convictamente: - Detesto ser patrão! Aqui, são todos amigos.
É o mesmo homem que diz a um chofer novo que lhe abre a porta do carro, de boné na mão: - Olhe, não precisa abrir a porta para mim. Basta encostar o carro na calçada.
-É, como o com certeza o chofer demonstra espanto:
- Isso não se usa mais! O que não se usa mais, na opinião de Júlio de Mesquita Filho, é luta de classes, porque acha que o interesse do patrão é o mesmo do empregado. Respeito pela criatura humana. Democracia até as últimas consequências. Este homem, como subvertedor da ordem nacional, esteve preso durante alguns anos, fez vilegiatura em cadeia de toda espécie, foi exilado, teve seus bens confiscados. Nenhuma ditadura pode combinar com gente desta classe. Quando lhe perguntamos onde nasceu, sorri: - Na rua da Liberdade...Que se há de fazer? Às vezes, é preciso acreditar em predestinação.
O Sacrifício de Nada Adiantou.
Desejamos saber sua opinião: até que ponto temos lucrado com o banho de sangue de 32? Quais foram, no seu modo de ver, as vantagens que auferismo de tanto sacrifício? Suas palavras são amargas:
- Tudo foi inútil. O motivo é simples. O Estado Novo sempre viveu divorciado da alma brasileira. E o Exército deixou, nos lugares-chaves, as criaturas do ditador. Aí estão Gustavo Capanema, Negrão de Lima e Filinto Muller. Comenta, à margem: - Vi morrer muita gente às bordoadas na prisão, por ordem de Filinto Muller... Depois fala dos dias duríssimos do exílio, de sua recusa, após sete ou oito anos de sofrimentos, em seguir de novo para o exílio, pelos próprios pés: - Então, eles me mandaram para a fazenda de nossa família, em Vinhedo. Temos lá uma fazenda, há cinquenta anos...
O Bom Vizinho.
Aconteceu por acaso há dois anos. (O acaso não é o santo grande dos repórteres?) Uma caravana de repórteres assistia a Festa da Uva, em Vinhedo. Um homem falava em nome dos vizinhos. Eram interesses comuns a todos, que se expunham através de suas palavras. A luta pelo melhor cultivo da terra, as apreensões e responsabilidades, as alegrias, a recompensa suprema no sangue brotando da terra, em cachos sumarentos. Aquele homem interpretava, evidentemente, o sentimento de todos, pois que, à sua volta, sorriam os rostos contentes. Abraçavam-nos todos, familiarmente. Orgulhavam-se dele com evidente ingênuo orgulho, à maneira fraterna de quem sabe que pode contar com o vizinho, porque é um amigo. “Going my way?” parecia ser o sistema vigente. Todos seguiam sem dúvida alguma a mesma estrada. Trabalho, ordem, respeito mútuo de direitos e deveres. Naquela reunião ninguém pensaria nunca: - Ora, a lei! – A lei, mais perto da força eterna da terra, é igualdade. Contamos esta passagem ao entrevistado, que comenta simplesmente: - Ah, também esteve na festa ano atrasado? Porque, no ano passado, também fui e também falei... Lá em Vinhedo, eu e meus irmãos fomos criados juntos com os vizinhos, assim como meus filhos foram criados juntos com os filhos deles. Há meeiros, sócios. Somos todos amigos. Este é o maior libelo contra a ditadura de qualquer espécie de qualquer época: são perseguidos justamente aqueles homens que mais realizam a democracia, na vida cotidiana. Os mesmos para os quais têm vivência os valores essenciais da criatura humana são julgados subvertedores da ordem, numa estranha inversão de valores.
Fonte.
Revista Mundo Ilustrado – Edição Comemorativa ,26º Aniversário da Revolução de 1932, publicada em 16 de julho de 1958. (Arquivo pessoal).
Algumas informações biográficas sobre os três entrevistados:
ALTINO ARANTES –
Altino Arantes Marques nasceu em Batatais (SP) no dia 29 de setembro de 1876, filho do Coronel Francisco Arantes Marques e de Maria Carolina de Arantes.
Terminando os estudos preparatórios no Colégio São Luís, de Itu (SP), ingressou aos 16 anos na Faculdade de Direito de São Paulo. Formou-se em 1895.
Em 1899, casou-se na França, com Maria Teodora de Andrade Junqueira.
Elegeu-se deputado federal pelo Partido Republicano Paulista (PRP) para a legislatura de 1906 a 1908, reelegendo-se depois para a seguinte (1909-1911). Eleito presidente do estado em março e empossado em maio de 1916, governou São Paulo até 1920, tendo enfrentado portanto o difícil período das greves operárias de 1917 a 1919, contra as quais agiu com severas medidas repressivas.
Após a vitória da Revolução de 1930, Altino Arantes passou para a oposição juntamente com o combalido PRP, participando assim de todas as etapas da crise entre o governo federal e as forças paulistas.
Em janeiro de 1932, foi um dos signatários de um manifesto do PRP em que este se pronunciava contra a “ditadura aliancista” e afirmava sua disposição de lutar por um novo regime republicano, constitucional e federativo.
Com o aprofundamento do conflito entre o governo federal e as forças políticas de São Paulo, o PRP e o PD se aliaram, dando origem à Frente Única de São Paulo (FUSP). Em 16 de fevereiro, a FUSP divulgou manifesto proclamando a união dos partidos paulistas na luta pela pronta reconstitucionalização do país e pela restituição a São Paulo da autonomia de que se achava privado desde a revolução. Altino Arantes foi um dos signatários desse manifesto, e quando a evolução da crise resultou na eclosão do levante armado de 1932 participou ativamente no movimento. Colaborou com o coronel Euclides Figueiredo na preparação do plano da luta armada, e durante a conflagração discursou na Rádio Bandeirantes, condenando o governo federal e apoiando a luta dos paulistas.
Quando a vitória pelas armas se revelou impossível, aderiu à proposta de armistício de Raul Pilla e Borges de Medeiros, expondo, sem sucesso, seu ponto de vista ao governador de São Paulo. Com a derrota da Revolução Constitucionalista, exilou-se em Lisboa.
Em 1934, de volta ao Brasil, assumiu a presidência do PRP e chegou a concorrer às eleições indiretas para o governo de São Paulo, sendo entretanto derrotado. Em 1938, ocupou o cargo de vice-presidente da delegação brasileira à VIII Conferência Internacional Americana, realizada em Lima, como ministro plenipotenciário.
Após a queda do Estado Novo, foi eleito deputado por São Paulo à Assembléia Nacional Constituinte em 1945 na legenda do Partido Republicano (PR). Participou dos trabalhos que resultaram na promulgação da nova Constituição (18/9/1946) e na legislatura ordinária que se seguiu, integrou a Comissão de Constituição e Justiça e opôs-se à cassação dos mandatos dos parlamentares comunistas.
Acompanhando grande parte dos antigos membros do PRP, ingressou no Partido Social Democrático (PSD) e, por esse partido, candidatou-se à vice-presidência da República no pleito de 1950, na chapa encabeçada por Cristiano Machado. Obteve 1.649.309 votos, ficando em terceiro lugar atrás dos candidatos Café Filho, da aliança Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) - Partido Social Progressista (PSP), com 2.520.790 votos, e Odilon Braga, da União Democrática Nacional (UDN), com 2.344.841 votos.
Altino Arantes teve ainda uma intensa atividade como escritor, tendo sido presidente da Academia Paulista de Letras por 14 anos e membro do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo.
Morreu em São Paulo no dia 5 de julho de 1965. Sobre sua vida e sua carreira, foram publicados inúmeros artigos em revistas e coletâneas, além do livro de Leopoldo de Freitas O Dr. Altino Arantes, esboço político e biográfico (1920).
AURELIANO LEITE -
Aureliano Leite nasceu em Ouro Fino (MG) no dia 20 de novembro de 1886, filho de João Monteiro de Meireles Leite e de Maria Almeida Meireles Leite.
Fez o curso primário em sua cidade natal e depois transferiu-se para a capital paulista, onde realizou os estudos secundários. Em 1906 entrou para a Faculdade de Direito de São Paulo, diplomando-se em 1910. Ainda acadêmico, foi colaborador do jornal Alvorada, e mais tarde de vários outros, como o Diário Popular, o Diário Nacional, a Folha da Manhã e o Jornal do Comércio.
Intimamente vinculado ao ambiente paulista, teve intensa atuação política.
Foi um dos signatários do manifesto publicado em 5 e 6 de abril de 1931, no qual o partido rompeu com a interventoria do capitão João Alberto Lins de Barros, a qual apoiara inicialmente.
Aureliano Leite assinou também o manifesto de 13 de janeiro, no qual o PD formalizou seu rompimento com o presidente Getúlio Vargas, em consequência do crescente antagonismo entre o governo federal e as forças políticas paulistas. O manifesto criticava a política econômica e administrativa de Vargas, propunha a constitucionalização do país e reivindicava a entrega do “governo do estados aos próprios estados”.
A partir de então, Aureliano Leite trabalhou ativamente pela formação da Frente Única Paulista (FUP), tendo ainda assinado o manifesto lançado em 16 de fevereiro de 1932, no qual o Partido Republicano Paulista (PRP) e o PD proclamavam sua união em torno do objetivo de lutar pela constitucionalização do país e pela autonomia política dos estados. Como delegado da FUP, viajou com Abelardo Vergueiro César para o Rio Grande do Sul, onde obteve de importantes personalidades gaúchas o compromisso de apoio, tornando-se assim um ativo articulador da Revolução Constitucionalista de 1932.
Fez parte da primeira direção do MMDC (sigla correspondente às iniciais dos nomes de quatro estudantes mortos em conflito com grupos tenentistas: Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo), grupo paulista que teve grande importância na preparação do levante e em sua organização. Com a tarefa de obter do governo de Minas Gerais o assentimento à revolta, foi enviado a esse estado por Pedro de Toledo, interventor nomeado por Vargas na tentativa de apaziguar São Paulo, mas que se tornara um dos chefes revolucionários. Aureliano, no entanto, nada obteve de concreto em Minas. Na preparação do levante armado, colaborou, ainda, com o Coronel Euclides de Oliveira Figueiredo, que o encarregou de reunir membros do MMDC para serem utilizados segundo a conveniência do plano de combate. Derrotado o movimento, asilou-se na Europa, tendo retornado ao Brasil somente com a anistia concedida pelo governo federal em 1934. Nesse mesmo ano elegeu-se deputado federal por São Paulo na legenda do Partido Constitucionalista, nascido com a união da maioria dos membros do PD e do PRP. Assumiu a cadeira em maio de 1935, mas seu mandato encerrou-se com o advento do Estado Novo (10/11/1937).
Foi membro da Academia Paulista de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, do conselho federal da Ordem dos Advogados do Brasil e sócio-fundador do Instituto dos Advogados de São Paulo.
Ensaísta e historiador, publicou, além de inúmeros artigos, discursos e grande quantidade de obras, entre as quais: Martírio e glória de São Paulo — Revolução Constitucionalista de 1932 (1934), Campinas que eu vi na Revolução de 1932 (1963).
Foi casado com Dulce Rudge Leite. Faleceu em São Paulo, no dia 4 de dezembro de 1976.
JÚLIO DE MESQUITA FILHO –
Júlio de Mesquita Filho nasceu na cidade de São Paulo no dia 14 de fevereiro de 1892, filho de Júlio César de Mesquita e de Lucila Cerqueira César de Mesquita. Seu pai foi advogado, deputado estadual na República Velha e proprietário do jornal O Estado de S. Paulo, fundado com o nome de A Província de São Paulo por seu avô materno, José Alves de Cerqueira César, grande proprietário rural representante da lavoura cafeeira do Oeste Novo paulista. Sua irmã, Raquel Mesquita, casou-se com Armando de Sales Oliveira, interventor federal em São Paulo de 1933 a 1935, governador de 1935 a 1936.
Após cursar o primário na Escola Caetano de Campos, na capital paulista, em 1904 foi enviado à Europa para prosseguir os estudos na Escola Acadêmica, em Lisboa. Mais tarde transferiu-se para a Suíça, onde frequentou o colégio La Chatelaine e depois o Liceu Oficial de Genebra, no qual ingressou com o objetivo de se preparar para o curso superior de medicina. Ao retornar ao Brasil, no entanto, decidiu matricular-se na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo, iniciando os estudos em 1911. Dedicando-se à política ainda estudante, participou em dezembro de 1916 da fundação da Liga Nacionalista, organização que surgiu como um desdobramento da Liga de Defesa Nacional com o objetivo de mobilizar os sentimentos patrióticos dos brasileiros e promover uma aproximação entre civis e militares através do incentivo ao serviço militar obrigatório. Coerente com essa proposta, engajou-se no 2º Regimento de Infantaria, sediado no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, e obteve um dos primeiros certificados de reservista do Exército.
Com o acirramento da tensão entre o governo central e as forças políticas paulistas, engajou-se nas articulações revolucionárias iniciadas em seu estado, apoiando, em fevereiro de 1932, a criação da Liga Paulista Pró-Constituinte, formada pelos acadêmicos da Faculdade de Direito de São Paulo com o propósito de arregimentar a juventude organizando-a em batalhões militarmente treinados para participar da luta armada que se aproximava. Apoiou também a Frente Única Paulista (FUP), formada ainda nesse mês pelo PD e o PRP visando o confronto com o governo federal. Foi um dos autores do boletim lançado em abril pela FUP e a Liga Paulista Pró-Constituinte, no qual a população era exortada “a repelir a indébita e injuriosa intromissão daqueles que estão conduzindo São Paulo e o Brasil à ruína total e à desonra”.
Um dos organizadores do movimento revolucionário deflagrado em 9 de julho de 1932, Júlio de Mesquita Filho atuou no vale do Paraíba junto ao estado-maior do Coronel Euclides Figueiredo. Com a derrota do movimento em outubro, foi preso e exilado em Lisboa, deixando a direção do jornal entregue a seu cunhado, Armando Sales. Durante o período em que permaneceu no exílio, dedicou-se a estruturar seu projeto de construção de uma universidade em São Paulo, e com essa finalidade visitou as universidades de Coimbra, em Portugal, da Sorbonne, na França, e de Roma, na Itália.
Teve uma vida política muito ativa, atribulada e conturbada, saindo várias vezes do Brasil.
Em 1966 foi eleito presidente da Associação Interamericana de Imprensa e no exercício desse cargo desencadeou uma campanha de combate à Lei de Imprensa implantada no país em 1967. Com a promulgação do Ato Institucional nº 5 (13/12/1968) baixado pelo presidente Artur da Costa e Silva, O Estado de S. Paulo foi apreendido e o principal editorial, intitulado “Nota um”, de sua autoria, deixou de aparecer. A partir de então, já doente, deixou a direção do jornal, transmitindo seus encargos aos filhos.
Foi casado com Marina Vieira de Carvalho Mesquita, com quem teve três filhos. Um deles, Júlio de Mesquita Neto, tornou-se seu sucessor na direção de O Estado de S. Paulo.
Faleceu em São Paulo no dia 12 de julho de 1969. Em sua homenagem foi criada em São Paulo a Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp).
Editado e publicado por Maria Helena de Toledo Silveira Melo.
02/09/2019.