domingo, 16 de setembro de 2012

Durval Moreira do Amaral: bravo guerreiro do litoral paulista na pugna da Revolução Constitucionalista de 1932


 

 

                                                                                      Ney Paes L. Malvasio *

 

 

       Durval Moreira do Amaral teve por berço a cidade de São Vicente, no litoral paulista, apesar de algumas fontes indicarem outra procedência. Maior prova disso é o seu nome gravado em letras indeléveis no monumento aos mortos da Revolução Constitucionalista em São Vicente.

       Quinze de fevereiro de 1911 marca a data de seu nascimento, sendo que os nomes de seus pais não foram olvidados pela história, e assim, necessário se faz relembrá-los: Euclydes Ribeiro do Amaral  e Ada Moreira do Amaral. Durval não veio ao mundo sozinho, pois fazia parte de numerosa prole, contando Walter, Deoclides, Gastão, Lourival e Dilermando como seus irmãos. A vida naqueles tempos da república velha notabilizava-se pelo grau de desenvolvimento atingido pelo estado de São Paulo, a “locomotiva do Brasil”, como se dizia na época. Entretanto, para Durval, a vida era um tanto dura, já que não provinha de uma família abastada e seus pais tinham a responsabilidade de criar seis filhos. Em vista do futuro que se lhe apresentava optou pela carreira militar e no seu tempo, a milícia paulista, a gloriosa Força Pública foi a alternativa escolhida pelo jovem do litoral.

       A Força Pública era um pequeno exército que, na verdade, era o sustentáculo armado do estado de São Paulo. Seus quadros contavam, durante a República Velha, com unidades de artilharia e aviação, além disso, o treinamento era ministrado por uma missão francesa de instrução militar, desde o mandato do presidente do estado (governador) Jorge Tibiriçá em 1906 que seguiu os conselhos de seu secretário da fazenda, Washington Luís Pereira de Souza (político, advogado, historiador), mais tarde tornou-se o presidente da república deposto pela Revolução de 1930.

       O ingresso na Força Pública era possível somente na condição de praça, e assim, Durval adentrou os portões da Escola de Recrutas (Escola do Soldado), localizada na capital paulista. A vida na caserna era extremamente difícil, dura e sofrida, lugar onde só os mais fortes sobreviviam, literalmente falando. Contudo, Durval do Amaral pareceu demonstrar aptidão para a carreira que escolheu. Em pouco tempo de serviço, pôde freqüentar a Escola de Cabos e, mais tarde, mereceu a graduação de sargento da Força Pública. Era um soldado nato!

       Mas, a vida não se resumia apenas ao quartel, à velha caserna, nesses anos de serviço, Durval se apaixonou e, por fim, contraiu casamento com sua amada Celina Sampaio. A união foi coroada com a vinda de dois filhos, Pedro Maurício e Ada, bela homenagem a sua mãe. Entrementes, a Revolução de 30 estourou em três de outubro e provocou o colapso da república velha e da política do café com leite. Getúlio Vargas subiu ao poder com o chamado governo provisório e São Paulo só tinha a esperar uma época de privações com o colapso da Bolsa de Nova Iorque em 1929 atrapalhando a economia ligada à exportação de café e o revanchismo político tornou-se regra geral, pois São Paulo simbolizava o antigo regime, acabando por sofrer as conseqüências, mesmo que tenha sido parte do braço responsável pela revolução, politicamente com o Partido Democrático e de maneira militar, com as tropas da velha coluna e o comando geral com o General de Brigada Miguel Costa, antigo comandante da coluna, oriundo da Força Pública.

       O povo paulista, no entanto, não consentiu em compactuar com o silêncio. O governo provisório de Vargas cada vez mais adquiria contornos de uma ditadura, e o povo de São Paulo começou a clamar por uma constituinte, o que era o passo mais lógico para a aprovação e regulamentação de um governo democrático. Outros fatos, também se somaram ao descontentamento geral da população, como a nomeação de interventores federais totalmente alheios aos anseios dos paulistas, como João Alberto, um dos tenentes da Coluna de 24, nascido em outro estado. Enquanto todo esse drama se desenrolava tal qual uma bola de neve vai se agigantando à medida que rola montanha abaixo, Durval, junto de sua unidade, o 5o. B.C.P.(Batalhão de Caçadores Paulistas) é mandado para Taubaté, a nova sede do batalhão anteriormente localizado na capital paulista.

       Inevitavelmente, veio o dia vinte e três de maio e com ele o estopim da epopéia que estava por vir. Quatro paulistas caem ante as balas do governo, apesar de pelo menos mais um morto e dezenas de feridos, mas seus nomes seriam imortalizados sob a forma de uma sigla: M.M.D.C. Após a tragédia ocorrida nas ruas de São Paulo, o processo  histórico se desenrolou de forma mais violenta, São Paulo escolheu seus líderes, Pedro de Toledo, Euclides Figueiredo, Marcondes Salgado, Bertoldo Klinger e outros, que liderariam aquele que passaria para  a História como o maior movimento cívico do Brasil republicano. A indignação era crescente e já não existiam mais argumentos capazes de frear o processo revolucionário.

       O 5o. B.C.P., em meio a todos esses acontecimentos, é posto de prontidão em Taubaté. Sua localização geográfica era crítica, pois servia de guardião do Vale do Paraíba, perto do limite com o Rio de Janeiro. Em nove de julho, então, o chamado às armas é ouvido nos quatro cantos de São Paulo, no 5o. B.C.P. a tropa limpa seus fuzis, prepara suas mochilas e parte para o setor do Túnel da Mantiqueira, aonde se estabelecem no dia 10 de julho, já debaixo dos primeiros tiros do fogo inimigo. O setor do Túnel era a chave da frente norte, e acabaria sendo o “moedor de carne” da Revolução de 32, tantos foram os que tombaram naquele estreito pedaço de serra. A posição nunca seria tomada à viva força pelas tropas governamentais, apesar da ulterior derrota do movimento constitucionalista no campo das armas.

       No túnel, os combates eram praticamente diários, os mortos tombavam uns após os outros nas trincheiras. Os paulistas são menos numerosos, mal armados e mal equipados, tudo é feito às pressas pela nascente indústria. Contudo, sobrava o ardor. Durval do Amaral estava no seu teatro, foi para aquilo que tinha sido treinado e, de forma nenhuma, decepcionaria aqueles que lhe depositavam confiança. Em pouco tempo de campanha é promovido ao posto de tenente por atos de bravura, galgou o oficialato em pleno campo de batalha!

       Mas, os azares da guerra são imprevisíveis. No início de setembro, as tropas constitucionalistas procuravam esboçar uma ofensiva para além de Silveiras. Em meio ao planejamento do ataque, surgiu uma missão arriscada, praticamente suicida na área do Morro Pelado. O capitão Odilon Aquino prefere pedir por voluntários para cumprir a missão, o tenente Durval prontifica-se imediatamente, era necessário desalojar o 19o. B.C. de suas posições, elemento crucial do dispositivo federal no setor de Silveiras. Durval do Amaral, ouvidas as instruções, parte acompanhado de outro voluntário, Milton Ferreira. O combate é renhido, os paulistas conseguem desalojar parte do 19o. B.C. de suas trincheiras, mas logo é encetado um furioso contra-ataque. No meio da pugna trágica, o tenente Durval é colhido pelas balas inimigas e cai sobre o solo por que lutara tão bravamente. Era o dia 3 de setembro...  nada mais havia para ser feito.

       Pouco depois, o corpo de Durval foi trasladado para a capital e sepultado no cemitério São Paulo. Durante as exéquias, um jornalista guardou as palavras de seu pai, Euclydes:

                                     ... orgulho-me da sua morte, pois ele soube ser um valente  e uma consciência a  serviço dessa luta sacrossanta. O seu exemplo ficará como o melhor ensinamento para todos aqueles que ainda são crianças e não puderam servir ao glorioso estado de São Paulo.[1]

 

 

[1] A. Miranda & Horácio de Andrade. Cruzes Paulistas.

 

*Mestre em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ/IFCS), membro da Associação de Combatentes de 1932/ Seção Santos, oficial reformado do Exército Brasileiro.

 

      

       Bibliografia:
 
    AMORIM, Santos. Santistas nas Barrancas do Paranapanema. 1.ed. São Paulo:  Carmelo Simone,      1932.

 

       MIRANDA, A., ANDRADE, Horácio de. Cruzes Paulistas. 1.ed. São  Paulo:

       Revista dos Tribunais, 1936.

 

       DONATO, Hernâni. A Revolução de 32. 1.ed. São Paulo: Abril, 1982.    

 

       MALVASIO, Luiz S. História da Força Pública. 1.ed. São Paulo: S.I.F.P.,1967.

 

       _________________. Resumo Histórico da Polícia Militar.  1.ed.   São  Paulo:

       S.I.F.P., 1972.

 

       AMARAL, Antônio B. A missão Francesa de Instrução da Força Pública de São

       Paulo. 1.ed. São Paulo: Dep. De Cultura, [s.d.].

    

       RODRIGUES, Olao. Veja Santos. 1.ed. Santos: P.M.S., 1973.



 

Um comentário:

  1. Olá Maria Helena.

    Moro em Santos/SP e gostaria de saber como e quando surgiram os Núcleos de Correspondência?

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