CARTA
ENVIADA À LIGA PAULISTA PRÓ CONSTITUINTE.
O
Dr. Paulo Maria de Lacerda, Presidente do Clube 24 de Fevereiro, enviou à Liga
Paulista Pró Constituinte a seguinte carta:
Rio
de Janeiro, 27 de maio de 1932.
Meus
jovens colegas da Liga Paulista Pró Constituinte.
A
24 do mês passado, quando saia do Teatro Municipal após a conferência, que
acabava de realizar a convite vosso, e via-me cercado por todos vós e grande
multidão de meus conterrâneos, levantei um viva a São Paulo livre,
correspondido e repetido com formidável emoção. Eu me dirigi, nesse momento aos
estudantes, cujo convívio me é sempre tão agradável e cativante pela
sinceridade das expressões com que se manifestam, e lhes disse energicamente
que desejava, que queria mesmo, que eles conservassem na alma e no coração, os
sentimentos nobilíssimos de patriotismo e de amor ao grande Estado onde
nasceram e estão concluindo a educação para lutar e vencer na vida, e que
tivessem a coragem de manifestar e até afirmar esses mesmos sentimentos. E
acrescentei que voltaria para o meio de vós, verificando se deverás, fostes
dignos de vós, das vossas famílias, da terra adorável que vos cobriu de benção
e carinhos os berços em que vos embalastes.
Aqui
nestas linhas preciso expandir a minha satisfação e o mais justo orgulho. Se
ainda me não foi dado efetivar aquela verificação, pessoalmente voltando ao
vosso grêmio, quero declarar de ânimo comovido, que reconheço haverdes
conservado acesos os crisões de tão elevados sentimentos que são os vossos
corações juvenis. Mas quero também vos dizer, com sinceridade e admiração que
deveis estar vigilantes, prosseguindo no propósito de lutar, heroicamente, como
tendes feito, pela Constituição por São Paulo; porque muitos e muitos perigos
cercam as vitórias conseguidas por vós, com esforço, constância, abnegação e
até com sangue – com o generoso sangue dos meus caros estudantes que, como o
dos mártires há de redimir os erros do presente e fecundar o coração paulista e
brasileiro para a mais vigorosa germinação dos verdadeiros sentimentos de amor
a Pátria consubstanciados na ordem legal, na conquista pacifica, generosa e
forte dos estados gloriosos no curso infinito do progresso humano.
Nestas
palavras vão as expressões da minha admiração e os mui sinceros cumprimentos do
velho colega e amigo – Paulo Maria de Lacerda
Esta
carta foi publicada no Jornal Folha da Manhã no dia 2 de junho de 1932.
CLUBE 24 DE FEVEREIRO
Associação
fundada em 16 de fevereiro de 1932 no Rio de Janeiro, na sede do Clube de
Engenharia, com a finalidade de “incrementar a campanha cívica em prol da volta
do país ao regime constitucional”. Sua denominação foi uma homenagem ao dia da
promulgação da primeira Constituição republicana, em 1891.
O
Clube 24 de Fevereiro foi criado num período de grande agitação política,
quando setores de oposição a Getúlio Vargas intensificaram suas pressões no
sentido da reconstitucionalização do país. Em São Paulo, em fevereiro de 1932,
foi fundada a Frente Única Paulista (FUP), coligação política formada pelo
Partido Democrático, pela “ala moça” do Partido Republicano Paulista e pela
Liga de Defesa Paulista. No Rio Grande do Sul, a Frente Única Gaúcha (FUG),
fundada em 1928, também participou do movimento em favor da reconstitucionalização.
A
primeira diretoria do Clube 24 de Fevereiro, escolhida no dia de sua fundação,
era constituída pelo general Lauro Sodré, ex-constituinte em 1891, que ocupou a
presidência; Paulo Lacerda e Nestor
Massena, indicados respectivamente para a vice-presidência e para a secretaria
geral, e os tenentes Adacto Pereira de Melo e Luís Albernaz (este último da
Marinha), eleito primeiro e segundo-secretários, respectivamente. Luís Ferreira
Guimarães e A. B. Machado Florence foram designados para as diretorias de
serviços internos e de serviços externos. Entre os membros do clube figuravam o
tenente Agildo Barata e José Eduardo de Macedo Soares, proprietário do Diário Carioca.
As
medidas punitivas contra o clube se acentuaram no final de fevereiro, quando o
capitão Floriano Keller e o tenente Adacto Pereira de Melo foram impedidos de
se matricular na Escola de Estado-Maior. Esses dois oficiais e o tenente
Flodoaldo Maia, que também era integrante do clube, foram transferidos do Rio,
sendo deslocados para guarnições distantes.
A
repressão ao Clube 24 de Fevereiro foi uma das causas do pedido de demissão,
datado de 3 de março de 1932, do ministro do Trabalho Lindolfo Collor. Em carta
a Vargas, Collor criticou, entre outros pontos, o ministro da Guerra, general
José Fernandes Leite de Castro, por este ter autorizado a transferência dos
oficiais ligados ao clube.
O
clube foi dissolvido pela polícia de Vargas no decorrer de 1932.
LIGA PAULISTA PRÓ
CONSTITUINTE
Organização
política criada em fevereiro de 1932 pelos acadêmicos da Faculdade de Direito
de São Paulo, sob a liderança de Roberto Vítor Cordeiro. Desapareceu após a
rendição das forças constitucionalistas, ocorrida em 2 de outubro de 1932.
Tendo
por quartel-general o “velho casarão das Arcadas”, ou seja, o prédio da
Faculdade de Direito, situado na praça cívica em que se transformara o largo de
São Francisco na capital paulista, a liga foi criada como o “órgão da mocidade
independente”, com o propósito de trabalhar pela arregimentação da juventude,
organizando-a em batalhões civis militarmente treinados para participar da luta
armada que se aproximava.
Através
de inúmeros boletins e proclamações, largamente distribuídos na cidade, a liga
conclamava os paulistas ligados à causa constitucionalista a comparecerem à sua
sede, onde se alistariam no exército civil e receberiam armas. Confiantes na
justeza de sua causa, grupos de estudantes distribuíam também panfletos e
afixavam cartazes divulgando suas palavras de ordem: “Paulistas: a Liga
Paulista Pró-Constituinte concita a juventude ao cumprimento do dever
indeclinável de cerrar fileiras em torno do movimento de redenção nacional que
ora se inicia.” Os jovens apelavam ainda para que as “mães paulistas”
autorizassem seus filhos a se empenhar na defesa da “honra de São Paulo”.
A
ação da liga durante a Revolução de 1932 foi intensa. O entusiasmo e a
combatividade que uniram os estudantes a ela filiados, identificando-os com os
demais agrupamentos políticos empenhados no movimento constitucionalista, não
foi capaz de resistir, entretanto, à força militar do governo federal. Após
quase três meses de luta armada, São Paulo acabou derrotado.
Com
o término da revolução, a maioria das organizações criadas principalmente para
alistar os civis paulistas se dissolveu.
Jovens da Liga Paulista em manifestação em São Paulo. |
Monumento na Faculdade de Direito, no Largo de São Francisco, São Paulo em homenagem aos acadêmicos que morreram durante a revolução de 1932 |
"A Cabeça", representa o estudante morto na Revolução de 1932, em bronze, esculpida por Adriana Janacopolis. |
Fonte.
Jornal Folha da Manhã, 2 de junho de 1932, acesso 02
de jun.de 2021.
http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/clube-24-de-fevereiro
http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/liga-paulista-pro-constituinte
http://blogdodelmanto.blogspot.com/
Editado e publicado por
Maria Helena de Toledo Silveira Melo.
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