Notícias do Front – São Paulo.
Nilson Carletti.
Encerrando o mês de julho, o cenário geral era de grande preocupação, notadamente quanto ao apoio logístico adequado para o enorme esforço bélico do Movimento Constitucionalista. De 22 a 30 de julho ocorreram combates violentíssimos nas várias frentes, dando ensejo a notícias alarmantes e contraditórias, sucedendo vitórias e derrotas para ambos os lados. Se o número de voluntários que se apresentavam aos postos do M.M.D.C. e aos quartéis da Força Pública não parava de aumentar – em uma quinzena estima-se que ultrapassavam cem mil homens – por outro lado, a produção do parque industrial não conseguia atender as necessidades para uma campanha que se mostrava longa.
Apenas no setor do Túnel da Mantiqueira, o gasto de munição por dia exigia 30 cunhetes, pelo menos, para que os combatentes pudessem repelir as ondas de atacantes que redobravam de violência a cada jornada; para a artilharia, a mesma carência de munição. Nos dois últimos dias de Julho, as tropas paulistas dispunham de apenas 15 cunhetes nessa região, enquanto que o comandante do setor, Cel. Sampaio, insistia nos pedidos de mais armas, munições e efetivos, encaminhando tais solicitações diretamente ao governador Pedro de Toledo.
A 1º de Agosto, o governador e o comandante militar da Revolução, General Klinger, convocam o engenheiro Gaspar Ricardo Júnior, então diretor da Estrada de Ferro Sorocabana, que recebe uma nova missão: criar fábricas, produzir munições, manter em funcionamento os fuzis e canhões paulistas e sul-mato-grossenses.
Com poderes ilimitados para cumprir a missão, Gaspar Ricardo Junior, iria chefiar o Departamento Central de Munições – D.C.M. com a meta inicial de produzir 400.000 cartuchos para fuzil Mauser, diariamente!
Com o apoio total da Escola Politécnica e da FIESP, em especial, para onde se apresentaram 740 engenheiros e 340 técnicos auxiliares, voluntários para todos os trabalhos a serem desenvolvidos, a primeira decisão de Gaspar foi dramática: mudar de local a Fábrica Nacional de Munições, localizada em São Bernardo do Campo, que estava vulnerável aos ataques aéreos, uma vez que a aviação getulista tinha total supremacia nas operações de ataque a São Paulo. A transferência para novo local secreto foi realizada em 60 horas, apesar do risco de deixar São Paulo à mercê de uma grande ofensiva que acabaria com todo o Exército Constitucionalista. Outra fábrica em área de grande risco era a de Piquete, localizada diante da linha de combate na Mantiqueira e que poderia ser transferida a qualquer momento, senão São Paulo perderia sua única planta de fabricação de pólvora!
Em trinta dias de exaustivo trabalho, o D.C.M. construiu mais uma máquina de conificar cartuchos, tamanho era o temor que a única máquina em operação pudesse parar, caso quebrasse uma única peça – o que significaria a derrota de São Paulo, por absoluta falta de munição para sustentar a Revolução.
Até o final dos combates, o Exército Constitucionalista, combateu com a munição produzida na antevéspera e até na véspera, e que era transportada às trincheiras pelo Serviço de Abastecimento das Tropas em Operações - S.A.T.O.
Ao longo da jornada constitucionalista vários engenheiros e técnicos dedicados pereceram ou sofreram graves mutilações nos acidentes que ocorreram durante os testes de novos explosivos e de novos armamentos - eram os combatentes que caiam no front dos laboratórios e dos campos de testes da campanha constitucionalista!
Nota – No livro, História da Revolução de 32 de Hernâni Donato, o autor cita uma segunda fábrica, montada por Nadir Figueiredo e Heitor Bertucia aumentou a produção e especializou-se em reaproveitar cartuchos enviados das frentes de combate pelo ir e vir ininterrupto dos caminhões do S.A.T.O.
Não havendo quantidade sequer razoável de cobre e de níquel para as camisas das balas, à Escola Politécnica foi entregue a missão de equacionar o problema. De um lado seu laboratório formulou liga especial a partir de alpaca possibilitando o fabrico de oito milhões de tiros. De outro lado, o público, solicitado, levou tanto cobre aos locais de recolhimento que a recepção foi suspensa passados vinte dias de coleta.
Armamento para proteção anti aérea |
[...] E aqui ficareis, Heróis-Mártires plantados, firmes: — para, sempre, neste santificado torrão de chão paulista.
Para receber-vos, feriu-se ele da máxima de entre as únicas feridas, na terra, que nunca se cicatrizam, porque delas uma imensa coisa emerge e impõe-se que as eterniza.
Só para o alicerce, a lavra, a sepultura, e a trincheira se tem o direito de ferir a terra.
E, mais legítima que a ferida do alicerce, que se eterniza na casa, a dar teto para o amor, a família, a honra, a paz.
Mais legítima que a ferida da lavra, que se eterniza na árvore a dar lenho para o leito, a mesa, o cabo da enxada, a coronha do fuzil; mais legítima que a ferida da sepultura, que se eterniza no mármore a dar imagem para a saudade, o consolo, a benção, a inspiração, mais legítima que essas feridas é a ferida da trincheira, que se eterniza na Pátria a dar a pura razão de ser da casa, da árvore e do mármore.
Este cavado trapo de terra — corpo místico de São Paulo, em que ora existis, consubstanciados, mais que corte de alicerce, sulco de lavra, cova de sepultura, é rasgão de trincheira.
E esta, perene que povoais, é a nossa última trincheira.
Esta é a trincheira que não se rendeu, a que deu à terra o seu suor, a que deu à terra a sua lágrima, a que deu à terra o seu sangue!
Esta é a trincheira que não se rendeu, a que é nossa bandeira gravada no chão, pelo branco do nosso Ideal, pelo negro do nosso Luto, pelo vermelho do nosso Coração.
Esta é a trincheira que não se rendeu... [...]
Trecho da Oração Ante a Última Trincheira, Guilherme de Almeida.
Fonte das imagens.
https://jornalggn.com.br/blog/luisnassif/
Editado e publicado por Maria Helena de Toledo Silveira Melo.
01/08/2018.
Nenhum comentário:
Postar um comentário