UM DOS 74 QUE O “SIQUEIRA CAMPOS” LEVOU AO EXÍLIO.
GUILHERME DE ALMEIDA POETA E SOLDADO RASO DA CONSTITUIÇÃO.
Por essa bandeira, em cujo louvor recita a sua poesia A Santificada, Guilherme de Almeida conheceu o exílio. |
Guilherme de Almeida foi soldado (Soldado Raso, fez questão de frisar) da 2ª Companhia do 1º Batalhão da Liga de Defesa Paulista, em ação no Setor de Cunha. Aí permaneceu quase até o fim, quando foi chamado a São Paulo pelo General Bertoldo Klinger para dirigir o jornal Trincheiras. De todas as suas poesias sobre a Revolução de 32, a única que realmente escreveu nas trincheiras foi (dito por ele) - A Moeda Paulista. Mas é do seu exílio, que nos fala. Do roteiro, após depor as armas, que começou no dia 10 de outubro.
- Nesse dia, recebemos um chamado telefônico. Deveríamos comparecer à Secretaria da Segurança Pública. Era apenas um convite, e nestes termos bem polidos: Se não puder comparecer não tem importância; venha quando quiser. Assim mesmo não faltou um sequer; todos comparecemos. Eram 72 paulistas, e entre eles, Altino Arantes, Pedro Vilaboim, Aureliano Leite, Assis Chateaubriand, Oswaldo Chateaubriand, Cirilo Junior, Júlio de Mesquita, Francisco Mesquita, Eurico Martins e Vivaldo Coaracy.
Ás 8 da noite, sem qualquer aviso fomos levados para uma estação intermediária da Central, de cujo nome antigo não recordo, mas que hoje se chama Carlos de Campos. Um trem nos esperava, aí, e fomos embarcados. Baby, minha esposa, estava junto, e foi a única mulher que seguiu com a leva dos exilados paulistas. Pelas 10, partimos e me lembro muito bem que lá de fora da noite, de um barranco da estrada, um desconhecido atirou uma pedra que veio estilhaçar o vidro da minha janela, quase atingindo Baby. Foi esta a primeira pedra que nos atiraram.
ZARPA O NAVIO DE MADRUGADA.
A viagem foi longe, a noite inteira e o dia seguinte, sob a guarda de soldados com metralhadoras. Chegamos no Rio quase ao escurecer e desta vez também o trem encosta na estação intermediária de Alfredo Maia.
Ali...
- meteram-nos dois a dois em carros de praça e agentes nos escoltaram até a Casa de Detenção, onde fomos alojados na Sala da Capela – uma sala comprida com camas de ferro. Com o nosso espírito de disciplina, tratamos de nos organizar para a vida em comum, e chegamos mesmo a eleger um mordomo, Silvio de Campos. Assim continuamos até que no dia 31 de outubro, às 9 da noite, Pedro, nosso guarda, veio avisar que íamos partir. Levaram-nos a bordo do Pedro I que sorrateiramente zarpou pelas 4 da madrugada de 2 de novembro. Era um navio sem condições de navegabilidade e viajando fora de rota.
TERNURA, EM LISBOA.
À chegada em Recife, os exilados paulistas foram transportados para o Siqueira Campos, que se afastando das costas brasileiras, os levou sem escala à Lisboa. E então, a 18 de novembro, a acolhida enternecedora, generosa, fraternal fê-los sentir-se, depois de tanto tempo, sob um teto de família.
- Cada um procurou alojar-se como pode, alguns ficando em Lisboa, outros tomando casa no Estoril. 30 dias depois chegava um grupo de esposas de exilados. Os paulistas estavam sempre juntos, em grande harmonia, abraçados pela ternura e pela compreensão dos portugueses. Quanto a mim, deixando Portugal fui mais tarde até a Espanha e a França. A ordem de regresso, no dia 13 de julho de 1933 encontrou-me em Paris. Embarquei de volta ao Brasil, onde cheguei a 30 de julho. Os outros companheiros fizeram o mesmo. Mas Álvaro de Carvalho e Haroldo Pacheco e Silva não voltaram. Morreram no exílio.
Guilherme de Almeida, para manter-se em Portugal, escrevia crônicas, enviando-as para o Diário da Noite, do Rio e o Estado, de São Paulo. Não quis receber a subvenção da Caixa dos Exilados que um grupo de senhoras paulistas organizara, entre elas D. Nicota Pinto Alves e Cota Klingerhoefler. Desistiu em benefício de outros.
Neste relato seco revela-se a têmpera do paulista, que falando do exílio, nem uma vez sequer falou na saudade (que sentiu).
O texto acima é a transcrição de matéria publicada no jornal Diário da Noite em 1957.
Guilherme de Almeida, seus três irmãos e o concunhado, voluntários constitucionalistas. |
Guilherme de Almeida - O Poeta da Revolução
Um dos homens mais lembrados da história da Revolução de 1932 é o famoso Guilherme de Andrade Almeida, o “Poeta da Revolução”.
Filho de Estevam de Almeida, famoso jurista e professor de direito, Guilherme estudou nos ginásios de Culto à Ciência, de Campinas, e São Bento e Nossa Senhora do Carmo, na cidade de São Paulo. Sua formação foi em direito, pela Faculdade de Direito de São Paulo, no ano de 1912. Nasceu em 24 de julho de 1890 em Campinas, SP.
Além de exercer a advocacia, Guilherme de Almeida também foi um competente jornalista, sendo redator do “O Estado de São Paulo”, diretor da “Folha da Manhã” e da “Folha da Noite”, fundador do “Jornal de São Paulo” e redator do “Diário de São Paulo”.
No ano de 1917, ele publicou seu livro de poesias, “Nós”. Anos depois, em 1922, foi um participante assíduo da Semana de Arte Moderna e seu escritório serviu de redação para os fundadores da revista “Klaxon”, mania da época.
Após auxiliar nesse processo de desenvolvimento artístico e intelectual de São Paulo, Almeida percorreu o país difundindo suas ideias de renovação. Seus livros “Meu” e “Raça”, ambos de 1925, são fiéis à temática brasileira e ao sentimento nacional.
Guilherme de Almeida seria amplamente reconhecido por seu talento com a poesia. Era um grande conhecedor dos versos e da língua portuguesa, sendo, inclusive, um excelente tradutor. Traduziu, entre outros, os poetas Paul Géraldy (“Eu e Você”), Rabindranath Tagore (“O Jardineiro” e “O Gitanjali”), Charles Baudelaire (“Flores das Flores do Mal”), Sófocles (“Antígona”) e Jean Paul Sartre (“Entre Quatro Paredes”).
Sua Atuação na Revolução
No ano de 1932, Almeida decidiu que ia ajudar São Paulo como pudesse. Ele desenhou os brasões de armas de várias cidades: São Paulo (SP), Petrópolis (RJ), Volta Redonda (RJ), Londrina (PR), Brasília (DF), Guaxupé (MG), Caconde, Iacanga e Embu (SP). Compôs também um hino a Brasília, quando a cidade foi inaugurada.
Mais do que isso, Almeida foi um combatente da Revolução e, após o fim das batalhas, acabou exilado em Portugal. Anos mais tarde ele seria homenageado com a Medalha da Constituição, instituída pela Assembleia Legislativa de São Paulo.
Sua maior prova de amor ao estado de São Paulo foi o famoso e belo poema conhecido como “Nossa Bandeira”. Entre outras homenagens à cidade, existem os poemas “Moeda Paulista” e a linda “Oração Ante a Última Trincheira”. Também escreveu a letra do “Hino Constitucionalista de 1932/MMDC”, O Passo do Soldado, de autoria de Marcelo Tupinambá, com interpretação de Francisco Alves
Foi membro da Academia Paulista de Letras; do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo; do Seminário de Estudos Galegos, de Santiago de Compostela; do Instituto de Coimbra e da Academia Brasileira de Letras.
Em homenagem aos pracinhas brasileiros, que lutariam na Segunda Guerra Mundial, ele escreveu a famosíssima Canção do Expedicionário, com a música do não menos genial Spartaco Rossi. Ainda em contribuição com São Paulo, Almeida foi presidente da Comissão Comemorativa do Quarto Centenário da cidade de São Paulo.
Guilherme faleceu em 11 de julho de 1969, em sua casa da Rua Macapá, no Pacaembu, em São Paulo – a “Casa da Colina” –, onde residia desde 1946. Adquirida pelo Governo do Estado na década de 1970, a residência do poeta tornou-se o museu biográfico e literário Casa Guilherme de Almeida, inaugurado em 1979, que abriga também, hoje, um Centro de Estudos de Tradução Literária.
Como uma das grandes homenagens póstumas, ele encontra-se sepultado no Mausoléu do Soldado Constitucionalista de 1932, no parque do Ibirapuera. Além dele, figuras como Ibrahim de Almeida Nobre, o “Tribuno de 32”; os jovens conhecidos pela sigla M.M.D.C. e do caboclo Paulo Virgínio.
Guilherme de Almeida trajando seu fardão da Acadêmia Brasileira de Letras. |
Medalha gravada com o poema de Guilherme de Almeida. (arquivo pessoal) |
Fonte.
Jornal Diário da Noite, Edição Especial, 9 de julho de 1957 (Arquivo pessoal)
http://www.saopauloinfoco.com.br/guilherme-de-almeida/
Editado e publicado pro Maria Helena de Toledo Silveira Melo.
31/05/2018.