quinta-feira, 12 de abril de 2018

Revelações do Coronel Luís Tenório de Brito sobre a Revolução Constitucionalista.





Em entrevista ao jornal Diário da Noiteo Coronel Luís Tenório de Brito, Comandante do “Destacamento Tenório”, dá seu depoimento e faz considerações sobre a Revolução Constitucionalista e a importante participação da Força Pública Paulista, confira na transcrição a seguir:


REVELA, CONVICTO, O EX-COMANDANTE DO “DESTACAMENTO TENÓRIO”.

NÃO HOUVE DIREÇÃO ESTRATÉGICA À ALTURA DO ÍMPETO REVOLUCIONÁRIO.




Sem armamento adequado e sem munições, a Força Pública enfrentou um adversário dotado de material de guerra moderno e abundante, afirma o Cel. Luís Tenório de Brito – Atingiu a 22.395 o número de voluntários 630 os que perderam a vida pela causa constitucionalista – Como se formou o destacamento que partiu para Apiaí.






Elemento integrante da organização administrativa, havendo o próprio governo do Estado se posto à frente da Revolução Constitucionalista, foi com dupla razão que a Força Pública se identificasse com o movimento de 1932 – declarou o Coronel Luís Tenório de Brito, comandante do chamado “Destacamento Tenório” que combateu na Região de Ribeira, ao Sul do Estado, as tropas da ditadura.
O então Major Tenório chamado a comandar o Batalhão “9 de Julho” viu estender-se o número de seus comandados. Pois ao Batalhão “9 de Julho” juntaram-se outros, formados por voluntários de Casa Branca, Jaú, Jaboticabal e outras cidades do interior, transformando-se em destacamento que se dirigiu à Itapetininga e depois Capão Bonito, Apiaí e Ribeira.
Luís Tenório de Brito, narram seus comandados, tornou-se celebre por sua calma e coragem nos momentos culminantes da luta.


FALTARAM ACESSÓRIOS ESSENCIAIS.

Luís Tenório, atual 1º Secretário do Instituto Histórico e Geográfico é autor do livro MEMÓRIAS DE UM AJUDANTE DE ORDEM prossegue em seu depoimento intitulado A FORÇA PÚBLICA E A REVOLUÇÃO DE 1932.
- A primeira razão está em que a Força Pública, em 1932, cumpria ordens superiores; a segunda porque, fazendo parte da comunidade bandeirante, comungava igualmente com os magnos anseios que então norteavam os destinos do planalto piratiningano. Necessário se faz notar, no entanto, que, não obstante a exaltação desde fins de 1930 empolgava a opinião pública paulista, pela ausência de cumprimento das promessas que vieram no bojo da subversão da ordem legal do país – a eclosão da Revolução Constitucionalista, no dia 9 de julho de 1932, constituiu surpresa geral em São Paulo, inclusive no seio da Força Pública. Organização militar obediente ao governo do Estado, cumpriu a Força, sem discutir, a ordem de mobilização para logo depois, na qualidade de tropa auxiliar, pôr-se à disposição do comando supremo do Exército ao qual coube a direção das operações de guerra.
Na época, dispunha a Força Pública de boa organização militar, com suas unidades bem enquadradas e instruídas, fuzis e metralhadoras o estritamente da tabela. Ausência completa de artilharia, engenharia, serviços de intendência e aviação.
Cumpria ao Exército supri-la nessas deficiências. Como, porém, a parte do Exército que aderiu à Revolução tinha pouco a sobrar de suas próprias necessidades, viu-se logo de início privada de acessórios essenciais em movimento de envergadura qual foi a Revolução Constitucionalista.


SETENTA BATALHÕES

As unidades aquarteladas na Capital, 1º e 2º Batalhões, de acordo com planos às pressas elaborados, seguiram incontinente para o Vale do Paraíba onde operaram do começo ao fim do movimento, como elementos básicos da luta sustentada pelas forças constitucionalistas, nessa região. O 3º Batalhão marchou para Ribeirão Preto, onde aguardou ordens. As demais unidades, distribuídas pelo interior paulista, no desempenho de suas funções normais foram encaminhando os seus elementos para lugares designados, equipados de fuzis e a simples munição que um destacamento policial comporta em tempo de paz. Enquanto essas providências eram tomadas pelo comando da Força, de acordo com instruções recebidas das altas autoridades do Exército, que dirigiam a Nação, a propaganda pela imprensa e pelo rádio fazia prodígios. São Paulo vibrava. De todos os escalões de sua sociedade, recebia o governo inequívocas provas de irrestrita solidariedade – traduzida, especialmente, no alistamento em massa de voluntários, prontos para a luta. Intensa a atividade. De toda parte surgiam os batalhões improvisados tanto na Capital quanto no Interior do Estado. Difícil o levantamento de tais unidades de guerra. Segundo Áureo de Almeida Camargo, em trabalho de pesquisa, o número beirava a casa dos setenta – cálculo esse que se aproxima dos dados que o General Manoel Rabelo alinha em entrevista dada a 26 de outubro de 1932, no Rio, analisando a Guerra Paulista.
A improvisação e preenchimento, por voluntários, de cada batalhão, organizados com efetivos normais uns – outros em números abaixo dos quadros, não era o bastante. A quase totalidade dos capazes que se apresentavam para o alistamento, apenas de leitura conhecia assuntos relativos à vida militar. Necessitavam, pois, de exercícios, sumários que fossem. Coube a Força Pública preencher a lacuna, destacando para a delicada missão seus melhores instrutores. Mas impunha-se também comando capaz para o Batalhão, a Companhia, o Grupo de Combate, serviços auxiliares, intercalação na tropa de soldados afeitos à vida do quartel, ao manejo das armas, à disciplina.


Assim, cada uma dessas 70 unidades de guerra (número provável), levava para o setor que lhe era destinado a média de 30 militares da Força, de graduações diversas, indispensáveis à condução com êxito dos bravos moços voluntários à luta. Houve ainda a colaboração de oficiais à confecção de armamento e munições no I.P.T. da Escola Politécnica, entre os quais o Capitão Lúcio Rosales, hoje Coronel Reformado, e a mobilização de esquadrões de cavalaria, qual o famoso Regimento Rio Pardo, que atuou com extraordinário sucesso em vários setores, composto de voluntários com instrutores e enquadramento da Força Pública. Até a improvisada esquadrilha de aviação forneceu a Força Pública oficiais brevetados que serviram às ordens do bravo então Major Ivo Borges.


TESTEMUNHO PESSOAL

A título de testemunho pessoal, prossegue Luís Tenório de Brito:
- Subcomandante do 3º Batalhão de Caçadores, estava eu em Ribeirão Preto quando a 25 de julho, já a minha unidade espalhada, subdividida, sem unidades – recebi ordem telegráfica de vir assumir o comando do 2º Batalhão do Regimento “9 de Julho”, organizado nesta Capital pelo Coronel Domingos Quirino Ferreira, com destemerosa rapaziada de Jaú e da Velha Mogiana – Casa Branca e adjacências, na sua maior parte.
Era aquilo que, certa vez, classifiquei de batalhão de qualidade, composto de engenheiros, médicos, advogados, professores, comerciários, bancários, jornalistas, entre estes Honório de Sylas, o cronista fiel da campanha. Todos, porém, empunhavam o fuzil. Eram soldados rasos.
O enquadramento se deu com pessoal da Força Pública e com aqueles voluntários que iam revelando inatas qualidades militares.
Muitos desses elementos da Força sucumbiram na peleja, podendo citar-se o Tenente Odilon e o Sargento Rosalino, mortos à explosão de uma granada inimiga, na trincheira que defendiam no lugar denominado Saltinho, à margem direita do Paranapanema.


O DESTACAMENTO “TENÓRIO”.

A mesma organização compunha o 6º e o 9º B.C.R. que vieram para o meu comando, constituindo-se então o “Destacamento Tenório”, de acordo com ordem baixada pelo Coronel Milton de Freitas Almeida, Comandante do subsetor, atualmente General do Exército. Quando os contratempos de guerra impuseram a famosa retirada de Apiaí– Vale do Ribeira – Santos, cujos dramáticos lances de sacrifício e de heroísmos magistralmente fixou Honório de Sylas no seu livro “Itararé! Itararé!”, com o 2º de “9 de Julho” marchou a tropa de voluntários que, sob o comando do valoroso Chefe Coronel Barbosa e Silva operava na região de Apiaí e, como todas, intercalada de oficiais e graduados da Força.
Desses elementos fazia parte o aspirante Fausto Querino Simões, hoje Coronel Comandante Geral da Força Pública de São Paulo.
Assim foi a Força Pública, na guerra paulista. Atuou em todos os setores, por toda parte, sustentando o fogo sagrado da luta sangrenta.


FALTOU DIREÇÃO E ESTRATÉGICA.

Contingências inevitáveis, é bem verdade, mas nem por isso menos prejudiciais à eficiência da Força Pública decorreram desse fracionamento. No dia 13, o 3º Batalhão recebera ordens de se deslocar para Ribeirão Preto, que atingiu no dia 15, acantonando a tropa no prédio de um dos Grupos Escolares da cidade. Em Ribeirão Preto perdeu o meu Batalhão grande parte do seu valor combativo, resultante do fracionamento a que se sujeitou, enviando, ora uma companhia, ora um pelotão, até mesmo grupos de combate, destinados a guarnecer pontos da fronteira próxima de Minas Gerais. Na guerra o conjunto é de importância capital. Não só no rendimento da tropa em combate como ainda e, principalmente, no espírito de corpo que aí se revigora em estimulo e solidariedade. Enquadrado o 3º Batalhão por uma oficialidade entusiasta e vibrante, integrada toda ela no alto sentido da Revolução Constitucionalista, sentia-se que duas coisas logo lhe prejudicaram a ação: o fracionamento e a tendência, logo concretizada, de caráter defensivo da luta. Defensiva e inércia, é antecâmara da morte. E foi o que infelizmente aconteceu. O colapso da Revolução Constitucionalista ocorreu por falta de movimento ofensivo. A divina loucura coletiva de São Paulo, como alguém classificou o levante piratiningano, contra a ditadura inepta e corrupta, faltou estratégia à altura do ímpeto inicial.


EFETIVOS REVOLUCIONÁRIOS.

A quanto se elevaram os efetivos revolucionários de São Paulo?
O Coronel Luís Tenório de Brito responde:
- Não há precisão absoluta. Duvido mesmo que alguém chegue a um resultado preciso. Pelo número de voluntários que integraram as unidades conhecidas – algarismos nunca uniformes – poder-se-á oferecer a média de 300homens para cada batalhão. Assim por volta de 20.000 terá andado a mobilização civil, no movimento constitucionalista.
O General Manoel Rabelo, que fora interventor em São Paulo antes de Pedro de Toledo, calculava a soma de 22.395 voluntários. Segundo seu raciocínio, 10.200 foram contribuição da Força Pública e 3.612 a parte do Exército que aderiu ao movimento no Estado. Assim, o total atinge a 36.207 combatentes. A Força Pública, pois terá concorrido com 28 por cento da tropa em ação, se considerarmos os algarismos expostos.



MORTOS DE SÃO PAULO NA REVOLUÇÃO.


Referindo-se ao livro Cruzes Paulistas, que resume a biografia de cada um dos que tombaram em 1932 por São Paulo, o Coronel Tenório de Brito informa:
- Lá estão alinhados 630 nomes, colhidos em todos os campos da luta gigantesca, entre as mais diferentes organizações militares que viveram o drama paulista daqueles dias inesquecíveis. Expressiva, sem dúvida, é a contribuição da Força Pública de São Paulo na gloriosa estatística. Elevam-se os seus mortos à soma de 194 homens ou 34% do total de mortos. Entre eles contam-se 9 oficiais inclusive o Comandante Geral, Coronel Júlio Marcondes Salgado, 3 alunos oficiais e 48 graduados (Cabos e Sargentos).
A Força Pública cumpriu com denodo, eficiência e espirito de sacrifício seu dever na grave conjuntura.
Sem armamento adequado e em déficit de munições, enfrentou ela adversário aguerrido infinitamente superior em número, bem enquadrado e dotado de abundante, moderno e variado material de guerra. Manteve a um tempo, nos três meses de luta, o equilíbrio em todos os setores de combate, enquadrou com elementos seus corpos de voluntários por ela postos em ação e conservou o fogo sagrado da luta nas mais ásperas frentes de batalha que lhe foram confiadas – até a completa exaustão dos elementos materiais – contingência a que São Paulo não pode fugir, sitiado que se viu desde os primeiros dias da Revolução.





 





Metralhadora em ação
 protegida pela perfeita camuflagem







 







 








Cel. Júlio Marcondes Salgado passa em revista as tropas.







 



A seguir algumas imagens da Força Pública em ação, em diversos setores




 






 










 






 



Fonte.

Edição Especial do jornal Diário da Noite de 9 de julho de 1957. (Arquivo pessoal).





Editado e publicado por Maria Helena de Toledo Silveira Melo.
12/04/2018



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