terça-feira, 24 de abril de 2018

A PARTICIPAÇÃO DOS ENGENHEIROS NA REVOLUÇÃO DE 1932.



Vejam, na transcrição a seguir, o depoimento proferido pelo Engenheiro Amador Cintra do Prado sobre a participação dos engenheiros na Revolução Constitucionalista de 1932, o qual foi publicado no jornal Diário da Noite em 1957.




EM ABRIL DE 1931, ENGENHEIROS EXIGIAM A CONSTITUINTE.

INFILTRAÇÃO DE DERROTISTAS INIMIGOS TENTOU NOSSA CAPITULAÇÃO EM JULHO.


Depoimento do Engenheiro Amador Cintra do Prado, no Instituto Histórico - Missão de Arruda Pereira: adquirir navios, armas e munições no estrangeiro, viajando por Mato Grosso, Paraguai e Argentina - Quem minou o porto de Santos para evitar desembarques -  Major se transforma em caboclo para espionar ditatoriais no setor Norte -  Engenheirandos eram os primeiros a utilizar as armas que fabricavam.




Amador Cintra do Prado



Em 23 de abril de 1931, quinze meses antes do movimento armado, por decisão da Assembleia Geral, o Instituto de Engenharia dirigiu-se diretamente ao Chefe do Governo Provisório, “apelando com respeitosa insistência para que convocasse a Constituinte no mais curto prazo possível”. Em seguida, com a Ordem dos Advogados e Sociedade de Medicina e Cirurgia, conclamou todas as associações de classe para um amplo movimento de opinião em favor da Constituinte, dirigindo-se frontalmente aos três encarregados pelo Governo para a elaboração da Reforma Eleitoral.
Tais palavras foram proferidas no Instituto Histórico pelo Engenheiro Amador Cintra do Prado, em seu depoimento sobre a participação dos engenheiros paulistas no Movimento Constitucionalista.


ESPIRITO REVOLUCIONÁRIO

Desde 23 de maio de 1932 a sede do Instituto de Engenharia começou a centralizar diariamente o nosso pensamento político de reação ao caudilho. Amigos e colegas se dispunham francamente a uma revolução que implantasse de novo a Lei. Organizaram-se grupos que deflagrariam em cadeia ao primeiro toque de reunir e num desses grupos fui envolvido – disse o Sr. Amador Cintra do Prado.
E prosseguindo:
_ O toque de reunir veio de surpresa, à noitinha do dia 9 de julho. À hora do jantar os telefones tilintaram. “Olhe! Chegou a hora. Hoje, às 22 horas, em tal ponto, em tal edifício, em tal lugar”. Havia arrebentado a Revolução Constitucionalista, chefiada militarmente pelo Gal. Klinger, que de Mato Grosso estava vindo para unir-se às forças políticas agrupada na Frente Única e as classes conservadoras, comandadas pela Associação Comercial e Federação das Indústrias. As tropas federais aquarteladas nos Estados, devidamente trabalhadas, eram solidárias e assim seus comandantes, na mesma tarde, tomaram posição e iniciaram o movimento rumo ao Rio de Janeiro. A Central do Brasil teve seus trens interrompidos em Caçapava, Lorena, Pindamonhangaba e Cruzeiro, onde oficiais revoltosos, num mal entendido inicial, precipitadamente detiveram e prenderam o General Pereira de Vasconcelos, novo comandante da Região Militar que para aqui vinha como aliado da causa constitucionalista.


PARTICIPAÇÃO.

Nessa noite, na sede do Instituto se discutiam medidas de urgência e de tática. Ocupar por elementos de confiança a Telefônica, os Correios e Telégrafos e sobretudo a ferrovia que ligava São Paulo ao Rio. Em poucos minutos, quatro engenheiros se dispuseram à tarefa e rumaram à Estação do Norte para efetivar a medida preliminar, como de fato fizeram. Foram eles Plinio de Queiróz, Cincinato Cajado Braga, Paulo de Sousa e Leovigildo Trindade. Começou assim a participação dos engenheiros no movimento militar, cujos acontecimentos se precipitavam de hora em hora.
No dia seguinte, desde cedo, alastrado agora por toda a cidade, continuou o ambiente de entusiasmo, de confiança e de previsão. Organizavam-se batalhões, tropas regulares se locomoviam, medidas administrativas se sucediam caracterizando a máquina de guerra que se punha em marcha.
Foi resolvido que se abrisse um alistamento para que a direção das Forças Constitucionalistas aproveitasse os engenheiros como julgasse preferível. Incontinente, a lista começou a se encher: nome, endereço, telefone. Na tarde do dia 11 a fachada da esquina da rua Cristóvão Colombo ostentava uma faixa: “A tradição bandeirante é de ação e sacrifício. Saibamos honra-la de armas nas mãos”.


FALTAVA COORDENAÇÃO.

À noite desse dia Plinio de Queiróz e Trindade, voltando de Jacareí e São José dos Campos comentavam, desolados, a desorganização das cidades ao longo da Central do Brasil, por onde passavam as tropas que seguiam para a Frente Norte, cujo Q.G. se estabelecera em Cruzeiro e a vanguarda constituída pela Força Pública já alcançara Queluz. Sentiam-se no ar a improvisação e o tumulto, a boa vontade de uns e as incompatibilidades pessoais de outros, a falta dum elemento coordenador e as necessidades imperiosas de retaguarda: alojamento, abastecimento, controle, tráfego. Não seria essa a função precípua dum engenheiro? Não representava isso a ausência dum perfeito técnico? Certamente. A solução era clara e ao mesmo tempo difícil porque era preciso conservar a autonomia política das autoridades constituídas. No dia seguinte, pela manhã, exposta a questão ao Governo, ao Secretário e aos chefes militares, com a presteza e a objetividade que a situação requeria, encontrou-se a resposta: criar-se-iam as Delegacias Técnicas, comandadas por uma Comissão Inspetora encarregada de organiza-las, aproveitando 180 engenheiros da lista em que se incluíam os nomes mais representativos da classe, inscritos nas primeiras 24 horas, e que aguardavam qualquer missão civil ou militar. Em mais 48 horas a lista do Instituto atingia 740 engenheiros e 340 auxiliares. À tarde se acertou a C.I.D.T. – Comissão Inspetora das Delegacias Técnicas – Alexandre de Albuquerque como chefe, no posto de Tenente – Coronel; e inicialmente quatro inspetores: Plinio de Queiróz, J.B. Almeida Prado, Leovigildo Trindade e eu, Amador Cintra Prado, nos postos de Major. Majores e Capitães seriam os demais delegados e seus auxiliares.


TELEFONES NO TÚNEL.

Nesse mesmo dia, às 18 horas, partiam os primeiros delegados: Armando de Arruda Pereira e Pedro França Pinto para Cruzeiro; Prudente Meireles de Morais e Marcial Fleury de Oliveira para Queluz. Dois postos no front; quatro batismos de fogo! Pois 24 horas depois estavam os quatro engenheiros, no escuro e sob o pipocar da fuzilaria, estendendo fios de telefone para ligar o P.C. à linha de frente do Túnel, da Rede Sul Mineira de Viação.
O s delegados técnicos da Zona Central partiram quase todos nos dias 15 e 16, e, apenas instalados, começavam a organizar a retaguarda. Requisições de veículos, com avaliação prévia; desapropriação de mercadorias, levantamento de “stock” e reabastecimento de gêneros; feitura de campos de aviação, organização de cantinas e casas de soldado para alimentar tropas estacionadas; reparo e muitas vezes, abertura de caminhos e estradas estratégicas. Se em meados ou fim de agosto tivéssemos vencido a Revolução, todas as Zonas de frente – Norte, Sul de São Paulo e Sul de Minas – só teriam recebido benefício por terem caído em zona de guerra.
Manda a verdade acrescentar, entretanto, que as próprias forças militares se beneficiaram da cooperação profissional dos engenheiros. Além dos telefones no Túnel, os colegas das Delegacias Técnicas funcionaram como oficiais efetivos e vários QQGG. Em Queluz foram engenheiros da equipe da Companhia Paulista que minaram e explodiram a ponte Central; e na hora do recuo, depois da saída das tropas do Coronel Teófilo de Ramos, o delegado técnico Major Marcial Fleury de Oliveira fazia retirar, em composição ferroviária, todo o material e toda a provisão que seriam uteis ao inimigo, para depois, em automóvel, qual comandante de navio naufragado, ser o último a deixar a praça. Entre Silveiras e Areias foram eles os engenheiros, sob as ordens do Major Alberto Prado Guimarães que estenderam linhas telefônicas de emergência ao longo das cercas, usando até postes de bambu e isoladores domiciliares ou feitos de rolha, numa improvisação inesperada pelo Coronel Sampaio, chefe do Setor, que dessa forma ficou em contato com o comando de seus diversos batalhões.
Logo adiante de Cachoeira, a artilharia do Coronel Vidal só dispunha dum mapa de guia Levi para orientar os tiros. Eis que os engenheiros do Major Leandro Dupré, em mapas da Com. Geológica e Geográfica, copiados e remetidos pela C.I.D.T., passaram a calcular os tiros e verificar, com telefones portáteis avançados, os estragos da nossa artilharia.
Em Lorena, sede do Regimento, o Major João Gonçalves Foz encanou o nervo onipresente do abastecimento, inclusive, dentro do próprio quartel.
Quando se anunciou que as tropas do Coronel João Alberto escalariam a Serra do Mar por Parati ou por Ubatuba, foi o delegado técnico de Guaratinguetá, o estoico Major Antônio Prudente de Morais, então recentemente sangrando pela morte de seu filho Prudente Meireles de Morais, delegado técnico telefônico para manter Cunha em permanente contato com o Comando Geral de Queluz, quem restaurou as rodovias e providenciou a linha.
Ao mesmo tempo, a Delegacia de São Luiz do Paraitinga, confiada ao Major Augusto Lindenberg, mobilizando colonos e camaradas, restaurava, em seis ou sete dias, a ligação rodoviária Taubaté-Ubatuba. Se o Coronel João Alberto tivesse chegado à Central do Brasil para cortar a retirada do Setor Norte, quem veria ele pela frente, fardado e eficiente, enfeitado pelas cãs de sua idade provecta, comandando Taubaté? Encontraria seu ex-secretário de Viação, Major Alberto de Oliveira Coutinho.
Todas as cidades, especialmente no chamado Norte, ganharam campos de pouso, alguns até com pista de um quilometro, como Jacareí, confiada ao Major Heitor Portugal, ou como Mogi Mirim, Zona Leste, confiada ao Major José Rangel de Camargo. Estes e outros melhoramentos nem sempre foram conservados e devidamente valorizados pelos prefeitos e políticos que se sucederam. Representavam a preciosa colaboração de outro ramo da engenharia que hoje eles todos reclamam para o desenvolvimento de seus municípios: o D.E.R. – Departamento de Estradas de Rodagem. Desdobramento da mesma classe de técnicos empenhados na luta de então, o departamento chefiado por Carlos Quirino Simões se mobilizou rapidamente, e São Paulo assistiu ufano a uma transformação notável. Os seus engenheiros, velhos e moços, deixando a Capital ou as cidades, trocavam suas funções de escritório, e partiam, voluntários e fardados, para as zonas de operações passando a exercer no campo ou rentes dos caminhos, plainas e moto niveladoras, as funções de chefe, de mestre ou de motoristas, a fim de que tudo fosse rápido, bem feito e oportuno.




Arruda Pereira




MISSÃO DE ARRUDA PEREIRA.

Cruzeiro, sede do Q.G. principal e centro distribuidor de tropas, ficou seriamente comprometida na parte sanitária, por falta de água. Em quatro dias, vencendo inclusive a suscetibilidade do prefeito político, os engenheiros da Delegacia Técnica, sob o comando do Major Armando de Arruda Pereira, Major Inspetor e Sanitarista, deram o reforço suficiente que se transformou em beneficio permanente para a rede de água local.
Falando do Engenheiro Armando Arruda Pereira quero salientar que seu patriotismo e entusiasmo pela causa não se limitou ao trabalho dedicado da Delegacia Técnica nem ao risco evidente de vida na epopéia do Túnel. Foi depois solicitado e aproveitado na honrosa, difícil e arriscada missão de adquirir navios, munições e armas no estrangeiro, para onde partiu em acidentada excursão via Mato Grosso, Paraguai e Argentina. Terminado o exilio, aqui retornou e pôs mãos a uma empreitada tão valiosa como as outras; organizou e publicou um livro cujo produto reverteria em custear as homenagens aos engenheiros mortos. Não pode fazer com a amplitude que imaginara pois lhe faltaram algumas contribuições importantes, mas publicou em 1934, sob o pseudônimo de Athyr Morgan – seu nome de guerra no exterior – o precioso trabalho “Engenheiros de São Paulo em 1932” com mais de 400 páginas, enriquecido com fotografias, mapas e copiosos fatos políticos relacionados com a guerra.


ENGENHARIA.

Não ficaram, entretanto, restritas ao setor Norte as atividades das Delegacias Técnicas. Guardadas as proporções, os outros setores que não se encontravam na ofensiva dirigida contra o Rio de Janeiro, e eram antes setores de ofensiva e cobertura, nem por isso ficaram alheios a colaboração dos engenheiros. Verdadeiro trabalho de organização e preparo, alcançando as rodovias, as requisições, o abastecimento das tropas e populações, foi o que fizeram as Delegacias Técnicas, suprindo o improviso da ação militar, desencadeada com surpresa para o Interior, mas abraçada com a sinceridade, sustentada com ardor, por um povo antes preocupado no trabalho pacífico de produzir para engrandecer o País.
As cidades ao longo da E.F. Sorocabana foram ligadas às vizinhas ou adjacentes, e a linha de frente Sul, que se estendia de Apiaí a Itararé, graças a essa organização pôde encolher-se, passo a passo, em ordem e conveniência, para Guapiara, Rio das Almas, Capão Bonito e Gramadinho na rodovia; e para Faxina, Buri e Engenheiro Hermilho na Sorocabana, tendo Itapetininga como centro onde o Major Sérvulo Pacheco e Silva atendia ao Coronel Taborda, Comandante do Setor. Mais ao norte, a Alta Sorocabana até Presidente Venceslau teve, nas Delegacias Técnicas, um batalhão de engenheiros desenvolvendo o mesmo ritmo de organização e controle para que as forças ditatoriais, se por lá tencionassem transferir a ofensiva de retaguarda, encontrassem as nossas tropas em guarda e em defensiva como em qualquer setor.
As Delegacias Técnicas do Setor Leste, dispostas ao longo das divisas de Minas, desde Piracaia e Bragança até Mococa e Franca, tiveram início as mesmas atividades de prevenção e controle, mas de setembro em diante mudou o panorama, quando os ditatoriais empreenderam alcançar Campinas e o então Coronel Eurico Dutra, entrando por Pouso Alegre, se fez centro do leque em ofensiva. Mas os engenheiros que lá se achavam, animados pelo mesmo civismo dos outros, passaram a desdobrar-se no abastecimento das tropas, na ampliação dos transportes e dos meios de comunicação. Zona onde predominavam os voluntários entusiasmados e valorosos, mas inexperientes, as ações militares de ataque ou defesa, se desenvolviam isoladas e heroicas, com baixas e frustrações que obrigavam as Delegacias a redobrada atividade. O idealismo supriu tudo, e mesmo nessas condições foi lentamente que as frentes se encolheram.
Interessante notar, nesta altura que a C.I.D.T. isto é, a Comissão Inspetora através dos telefonemas ou pala urgência de material solicitado – gasolina, munição ou veículos –sentia nitidamente onde a ação inimiga se reforçava, e pode várias vezes pressentir, para prevenir com ordem, o início das retiradas ou o alertamento para fases mais duras de resistência.


UM PLANO DE CAPITULAÇÃO.

Certo dia, em fins de julho, à uma e meia da madrugada, quando eu apenas depusera o talabarte, tilintou o telefone. Era nosso Coronel Chefe, Dr. Albuquerque que minutos antes eu deixara em sua casa. “Amador, disse-me ele, preciso partir incontinente, para Cruzeiro. Posso contar com a sua companhia?” Claro que podia e partimos dentro de uma hora, depois de passar pelo Instituto de Engenharia. Em São José dos Campos, Caçapava, Lorena e Cruzeiro, o Dr. Albuquerque conferenciou reservadamente com os Comandantes superiores, na ida e na volta. Dias depois, em conversa com Plinio Queiróz, que promovera a excursão e dela participara, fiquei sabendo que essa viagem e essa atitude do chefe da C.I.D.T. haviam feito abortar uma “trégua para entendimentos” que seria a nossa capitulação, falsamente atribuída a uma falta de recursos e reservas. Uma infiltração derrotista de origem inimiga minava o entusiasmo dos sinceros. Afastados com habilidade e presteza os elementos suspeitos, a luta prosseguia, por mais 60 dias, com denodo que ainda hoje nos emociona.
Uma ocasião foi observado pelos Delegado Técnicos da Zona Norte que certo Juiz de Direito de Comarca muito avançada, diariamente, fazia viagens de ida ou de volta para São Paulo. Suspeitava-se da sua lealdade por alguns indícios. Ordenada sua detenção, no dia imediato, na passagem de nível de Santo Ângelo, foi impedido de prosseguir para o front. “Era Juiz, declarou ele, tinha responsabilidade e só fazia visar o salvo conduto para dar exemplo”. Declaração inútil; aguardou detido a chegada de um Major Inspetor que, polidamente, lhe fez ver que os delgados técnicos podiam avocar todas e quaisquer atribuições que se tornassem necessárias aos fins da Revolução, e assim pedia a ele que voltasse para São Paulo, porque além do mais, como todos sabiam, a sua comarca estava em poder dos adversários.
Em alguns lugares, as dissenções políticas ou prevenções pessoais criavam a impossibilidade de entrosamento no controle de abastecimento ou no suprimento das tropas. Era preciso que os delgados técnicos, insuspeitos, serenos e preocupados com a eficiência, se fizessem de juízes- de- paz entre autoridades locais, concitando-as a não agirem com independência altamente prejudicial. Lembro-me por exemplo de Botucatu, Major Luiz Assunção, de Mococa, Major João Monteiro da Gama, e de São José dos Campos, Major Rodrigo Claudio da Silva, onde os Majores inspetores – ameaçando direta ou indiretamente com a avocação ou destituição de qualquer atribuições – ajudaram os engenheiros – soldados a terem plena liberdade de ação para bem servir a Revolução.


PORTO DE SANTOS.

Em Santos – Major Elias Machado – os engenheiros que lá foram defender a causa revolucionária tinham uma variedade de serviços que merecia uma palestra. A defesa da costa, ampliada pela extensão das praias desembarcáveis; a serra, a G.PR e a estrada do Mar; as Docas e os serviços de armazenagem, sem falar que sempre se esperou auxilio externo e sempre se temeu que o bloqueio marítimo se aperfeiçoasse para permitir desembarque.
As forças ditatoriais nunca acreditaram suficientemente na capacidade de trabalho dos paulistas, e a duração da luta com material bélico eficiente produzido por nós mesmos sempre lhes pareceu fornecimento estrangeiro que burlava o bloqueio.
Um conjunto de holofotes poderosos impedia uma surpresa à noite, tanto na entrada da barra, como nas praias de Santos, Guarujá e São Vicente; depois afinal, o Porto foi minado. Entrementes os Fortes ficaram com ligação e abastecimento permanente. Tudo isso engenharia da Delegacia Técnica a serviço dos ideais de 32.


QUEM MINOU O PORTO DE SANTOS.

A propósito, permito-me lembrar um episódio que ressaltará ainda mais, a brava gente da engenharia. Acabei de dizer que o Porto afinal foi minado. Mas como? Era auxiliar à Delegacia Técnica o Engenheiro Pujol Junior. Depois de feitas as defesas comuns atrás referidas, ele soube da munição disponível, e num relance verificou a inutilidade do trabalho realizado. Dirigiu-se “sponte sua”, ao chefe da defesa marítima e calculando aritmeticamente, em função das armas e do efetivo das tropas, demonstrou que a munição daria apenas para três ou quatro minutos de fogo. “Se eles souberem, o desembarque se fará, porque depois desses minutos iniciais o nosso fogo cessará de vez, sem outra possibilidade. Temos que minar o Porto. Encarregou-se ele próprio da missão para tranquilidade do Comando”. O mais interessante é que depois do armistício, foi o mesmo engenheiro Pujol Junior convidado pela Marinha Ditatorial a desfazer o serviço. Negou-se peremptoriamente. Preso, prontificou-se apenas a dar a localização e as profundidades das minas; numa discussão em mesa redonda onde demonstrou tal proficiência, que lhe deram um banquete a bordo. Depois disso, ele consentiu em dirigir a limpeza. Seguiu, porém, preso para o Rio onde somente foi solto depois de repetir, explicar e defender o plano da minagem perante vários almirantes, o que lhe fez receber gerais elogios.

ESCOLA POLITÉCNICA.

Entretanto não foi somente nas fileiras da C.I.D.T. que os engenheiros serviram à causa.
Quatorze professores da Escola Politécnica, por exemplo, em 23 de maio, subscreveram um abaixo assinado de solidariedade ao povo paulista que violentamente iniciava a arrancada contra a ditadura. Surpreendia a Escola pela irrupção do movimento, “os professores e assistentes, em reunião da Congregação, coletiva e individualmente, sem restrições, se punham à disposição das Forças Constitucionalistas, causa de São Paulo pelo Brasil unido”. Nesse interregno, isto é, de 23 de maio a 9 de julho, alguns de seus elementos se envolveram na preparação do movimento, como neste auditório foi referido pelo Engenheiro Frederico Abranches Brotero e Dr. Luiz Piza Sobrinho. Já se tinha em mente colocar os recursos da técnica a serviço da ação militar, para não faltar material e para amparar as restrições fatais de um bloqueio, determinado pelas forças que desfrutavam conscientes as vantagens do regime de então.


ENGENHEIRANDOS.

O exemplo dos mestres era seguido pelos alunos, e os futuros engenheiros trabalhando na Escola e no material bélico, aprendendo a lidar com as armas que se fabricavam, foram espontaneamente os primeiros granadeiros e obuzeiros voluntários. Armados e municiados engrossaram as frentes para fortalecer os ataques. Pessoalmente, entre Amparo e Itapira assisti a chegada duma leva deles, alta noite, num trem de reforço, pois a pressão do Cel. Eurico Dutra era séria, bem conduzida, inclusive com intenso bombardeio prévio para efeito psicológico sobre a população mais do que sobre a tropa. Na mesma noite os engenheirandos de então tomaram posição e na manhã seguinte tomaram a iniciativa de fogo. Essas bombardas – diz Gaspar Ricardo no relatório incorporado ao livro de Arruda Pereira – era uma criação do D.C.M. que grande sucesso causou nas trincheiras. Os célebres “sapinhos” eram obuzeiros de relativo alcance (cerca de mil e quinhentos metros) muito manejáveis, seguros e certeiros. Eram disputadíssimos por todas as guarnições que gastavam os seus melhores “pistolões” para obtê-los do D.C.M.


ABASTECIMENTO.

Obra de engenheiro foi o sucesso de outras atividades que alimentaram ininterruptamente a sobrevivência das operações militares, as quais sem ela, muito mais cedo, teriam cessado. Lembremo-nos por exemplo do que fez o Engenheiro Horácio Rodrigues, imaginando, organizando e sustentando até o fim a S.A.T.O. – Serviço de Abastecimento das Tropas em Operações. Verdadeira intendência de guerra, estava presente em todas as frentes e em todos os campos. Atuava diretamente e atuava em perfeita harmonia com os demais serviços auxiliares. Não distinguia, na presteza, o que era comida, roupa, remédio, gasolina ou veículo; não conhecia horário nem se detinha em formalidades; procurava em primeiro lugar abastecer, e abastecia a hora e a tempo. Terminada a luta, ocupado militarmente São Paulo, ainda continuou trabalhando para que não se prejudicassem os que ajudaram a lutar.


TRANSPORTES.

Os transportes ferroviários se concentraram nas mãos do Engenheiro Jayme de Castro Barbosa, que manobrando todas as estradas como se não houvesse diferença de empresa ou bitola, unificou a rede paulista, ampliando-a com ramais rodoviários que atingiram todas as zonas de operações.
Por mais de um orador já se foi lembrado que a luta principal se desenvolveu no Setor Norte. Lá os transportes rodoviários cresceram de vulto e foi preciso para eles uma verdadeira organização subsidiária. Criou-se e funcionou, em termos e disciplina de caserna, o Quartel General dos Motoristas, chefiado pelo dinamismo incansável que não conhecia vigílias, do Engenheiro Domício Pacheco e Silva.
Ordem, eficiência e vigilância, como se fora regimem ditatorial, e assim pode o transporte rodoviário desse setor se equiparar e, às vezes, ultrapassar o alcance da ferroviária correspondente.
Os trens blindados, as turmas de reparos e restauração, do reforço de pontes e pontilhões, e até as equipes de destruição quando se fizeram necessárias, foram em todas as frentes colaboração de engenheiros que, misturados aos operários e voluntários, supriram os especializados sem fugir aos perigos da fuzilaria, metralha e bombardeio. Vários deles pagaram tributos de sangue e de mutilação para honra própria e da classe.
Quando em meados de agosto se encontravam abertas e localizadas as trincheiras avançadas, surgiu o problema complementar da munição de boca. Discutida a solução, assentada a forma pelo pessoal do Q.G. de São Paulo, teve o Engenheiro Samuel Ribeiro o gesto nobilitante de, às suas expensas, mandar confeccionar e fornecer de acordo com a lista aprovada pelo Comando Geral, todas as “Refeições de Emergência”, e coube à C.I.D.T. o encargo de leva-las diretamente às últimas trincheiras. Mais de uma vez, e em várias frentes, foi-me determinado acompanhar nesse original serviço das Delegacias Técnicas os caminhões que as distribuíam “in loco”. Alimentação frugal e fria, várias vezes foram as únicas refeições recebidas para o passadio de 48 horas. Para amenizar este relatório vou contar o que aconteceu a mim e ao sargento distribuidor, na ala direita da linha Engenheiro Hemílio. Fomos advertidos de que a melhor hora para atingir a trincheira em vista, seria depois de uma hora da madrugada quando normalmente cessava até o fogo de inquietação. Cautelosos, e meio no escuro, atingimos a trincheira e avançamos rapidamente. Surpreendemos o sentinela dormindo: acordando quando estávamos a 4 ou 5 metros, assustou-se e fugiu rapidamente à luz do farolete. Nós, mais rápidos do que ele, retrocedemos também com a caixa das 50 rações porque, pelo modelo de farda e ausência de capacete do sentinela, vimos logo um ditatorial... Além do susto e da corrida não houve maiores consequências.







OUTRAS ATIVIDADES.

Não posso silenciar sobre outras atividades que a seguir vou focalizar com as quais engenheiros de São Paulo ajudaram o movimento armado, aumentando as possibilidades de vitória. Vou começar com os trabalhos de engenharia no Quartel General, chefiados pelo Engenheiro Aarão Jefferson Ferraz, Major do Exército e ex -instrutor militar da Politécnica quando nela havia o serviço militar obrigatório. À sua disposição e sob suas ordens um grupo de colegas, chefiados por Gastão Mesquita na Zona Norte e Antônio Carlos Cardoso na Zona Sul, se mobilizou e trabalhou em regime de oficiais regulares, tanto no Setor Norte como no Setor Sul.
No Instituto Astronômico e Geofísico, o Engenheiro Alípio Leme de Oliveira, dos mais entusiasmados elementos que vinham da fase preparatória anterior à 9 de julho, ampliou e ativou a secção de cartografia de forma que preciosos mapas fossem confeccionados para uso de vários comandos, e cada qual assinalando, de preferência os dados particulares: rios, várzeas e elevações para localização de tropa e de comandos, rodovias e caminhos para o serviço de transportes; povoados e fazendas para orientação e referência.


O ESPIÃO PELO BEM DE SÃO PAULO.

Quase no final, em 18 ou 19 de setembro, foi necessário investigar a retaguarda das tropas inimigas que ocupavam Pinhal, Mogi Mirim, Guedes, Pedreira, Amparo, Tuiutí, Socorro e que fazendo cerco procuravam atingir Campinas. Queria o comando da Força Pública, responsável pelo setor, saber o efetivo das tropas, a qualidade e os números da artilharia e os nomes dos oficiais que dirigiam a operação. O engenheiro destacado para essa missão trocou sua farda de major por trajes de caboclo. Dez dias de caminhada contínua e disfarçada em que os dois primeiros dias se perderam por sorte do enviado. Ao transpor a terra de ninguém, um pelotão constitucionalista, desgarrado e escondido numa casa de colono, apanhou-o e sob ameaças, fê-lo retroceder como guia até Jaguariúna. Aí o Major Lejeune, informado por outros engenheiros que identificaram o colega, soltou o suposto caboclo, permitindo assim que ele reiniciasse a missão. Cumprida esta, infelizmente só na tarde de 29 de setembro, pode reatingir as tropas no P.C. das Mães dos Homens, em Bragança Paulista. Conduzido “incontinente” a Campinas, antes da madrugada do dia 30 transmitiu ele ao Coronel Herculano de Carvalho e Silva o resultado dos informes recolhidos. Infelizmente, repito, perdeu-se o esforço desse engenheiro porque a cessação da luta já estava decidida e nada mais havia a fazer na ocasião. As informações colhidas eram interessantes, mas já agora estão se apagando em minha memória, os números e os episódios originais que encheram aqueles dias aventurosos de quem fez espião pelo bem de São Paulo.













Fonte.
Edição Especial do Jornal Diário da Noite de 9 de julho de 1957 (Arquivo pessoal).






Editado e publicado por Maria Helena de Toledo Silveira Melo.

24/04/2018.



sábado, 21 de abril de 2018

Recordação.




 Convite - Cinquentenário da Revolução de 1932.





Nas comemorações do Cinquentenário da Revolução Constitucionalista de 1932 foi enviado aos associados (e familiares) da Sociedade Veteranos de 32 – MMDC um convite para a participação na solenidade e junto com o convite um adesivo comemorativo.
Esta comemoração especial, que aconteceu no Mausoléu do Soldado Constitucionalista, contou com a presença de Sua Excelência o Presidente da República, Sr. João Baptista de Oliveira Figueiredo.




















O adesivo comemorativo.





O convite, recebido por minha mãe, foi endereçado ao meu irmão José Joaquim Silva de Toledo na época já falecido.





Editado e publicado por Maria Helena de Toledo Silveira Melo.
21/04/2018.






quinta-feira, 12 de abril de 2018

Revelações do Coronel Luís Tenório de Brito sobre a Revolução Constitucionalista.





Em entrevista ao jornal Diário da Noiteo Coronel Luís Tenório de Brito, Comandante do “Destacamento Tenório”, dá seu depoimento e faz considerações sobre a Revolução Constitucionalista e a importante participação da Força Pública Paulista, confira na transcrição a seguir:


REVELA, CONVICTO, O EX-COMANDANTE DO “DESTACAMENTO TENÓRIO”.

NÃO HOUVE DIREÇÃO ESTRATÉGICA À ALTURA DO ÍMPETO REVOLUCIONÁRIO.




Sem armamento adequado e sem munições, a Força Pública enfrentou um adversário dotado de material de guerra moderno e abundante, afirma o Cel. Luís Tenório de Brito – Atingiu a 22.395 o número de voluntários 630 os que perderam a vida pela causa constitucionalista – Como se formou o destacamento que partiu para Apiaí.






Elemento integrante da organização administrativa, havendo o próprio governo do Estado se posto à frente da Revolução Constitucionalista, foi com dupla razão que a Força Pública se identificasse com o movimento de 1932 – declarou o Coronel Luís Tenório de Brito, comandante do chamado “Destacamento Tenório” que combateu na Região de Ribeira, ao Sul do Estado, as tropas da ditadura.
O então Major Tenório chamado a comandar o Batalhão “9 de Julho” viu estender-se o número de seus comandados. Pois ao Batalhão “9 de Julho” juntaram-se outros, formados por voluntários de Casa Branca, Jaú, Jaboticabal e outras cidades do interior, transformando-se em destacamento que se dirigiu à Itapetininga e depois Capão Bonito, Apiaí e Ribeira.
Luís Tenório de Brito, narram seus comandados, tornou-se celebre por sua calma e coragem nos momentos culminantes da luta.


FALTARAM ACESSÓRIOS ESSENCIAIS.

Luís Tenório, atual 1º Secretário do Instituto Histórico e Geográfico é autor do livro MEMÓRIAS DE UM AJUDANTE DE ORDEM prossegue em seu depoimento intitulado A FORÇA PÚBLICA E A REVOLUÇÃO DE 1932.
- A primeira razão está em que a Força Pública, em 1932, cumpria ordens superiores; a segunda porque, fazendo parte da comunidade bandeirante, comungava igualmente com os magnos anseios que então norteavam os destinos do planalto piratiningano. Necessário se faz notar, no entanto, que, não obstante a exaltação desde fins de 1930 empolgava a opinião pública paulista, pela ausência de cumprimento das promessas que vieram no bojo da subversão da ordem legal do país – a eclosão da Revolução Constitucionalista, no dia 9 de julho de 1932, constituiu surpresa geral em São Paulo, inclusive no seio da Força Pública. Organização militar obediente ao governo do Estado, cumpriu a Força, sem discutir, a ordem de mobilização para logo depois, na qualidade de tropa auxiliar, pôr-se à disposição do comando supremo do Exército ao qual coube a direção das operações de guerra.
Na época, dispunha a Força Pública de boa organização militar, com suas unidades bem enquadradas e instruídas, fuzis e metralhadoras o estritamente da tabela. Ausência completa de artilharia, engenharia, serviços de intendência e aviação.
Cumpria ao Exército supri-la nessas deficiências. Como, porém, a parte do Exército que aderiu à Revolução tinha pouco a sobrar de suas próprias necessidades, viu-se logo de início privada de acessórios essenciais em movimento de envergadura qual foi a Revolução Constitucionalista.


SETENTA BATALHÕES

As unidades aquarteladas na Capital, 1º e 2º Batalhões, de acordo com planos às pressas elaborados, seguiram incontinente para o Vale do Paraíba onde operaram do começo ao fim do movimento, como elementos básicos da luta sustentada pelas forças constitucionalistas, nessa região. O 3º Batalhão marchou para Ribeirão Preto, onde aguardou ordens. As demais unidades, distribuídas pelo interior paulista, no desempenho de suas funções normais foram encaminhando os seus elementos para lugares designados, equipados de fuzis e a simples munição que um destacamento policial comporta em tempo de paz. Enquanto essas providências eram tomadas pelo comando da Força, de acordo com instruções recebidas das altas autoridades do Exército, que dirigiam a Nação, a propaganda pela imprensa e pelo rádio fazia prodígios. São Paulo vibrava. De todos os escalões de sua sociedade, recebia o governo inequívocas provas de irrestrita solidariedade – traduzida, especialmente, no alistamento em massa de voluntários, prontos para a luta. Intensa a atividade. De toda parte surgiam os batalhões improvisados tanto na Capital quanto no Interior do Estado. Difícil o levantamento de tais unidades de guerra. Segundo Áureo de Almeida Camargo, em trabalho de pesquisa, o número beirava a casa dos setenta – cálculo esse que se aproxima dos dados que o General Manoel Rabelo alinha em entrevista dada a 26 de outubro de 1932, no Rio, analisando a Guerra Paulista.
A improvisação e preenchimento, por voluntários, de cada batalhão, organizados com efetivos normais uns – outros em números abaixo dos quadros, não era o bastante. A quase totalidade dos capazes que se apresentavam para o alistamento, apenas de leitura conhecia assuntos relativos à vida militar. Necessitavam, pois, de exercícios, sumários que fossem. Coube a Força Pública preencher a lacuna, destacando para a delicada missão seus melhores instrutores. Mas impunha-se também comando capaz para o Batalhão, a Companhia, o Grupo de Combate, serviços auxiliares, intercalação na tropa de soldados afeitos à vida do quartel, ao manejo das armas, à disciplina.


Assim, cada uma dessas 70 unidades de guerra (número provável), levava para o setor que lhe era destinado a média de 30 militares da Força, de graduações diversas, indispensáveis à condução com êxito dos bravos moços voluntários à luta. Houve ainda a colaboração de oficiais à confecção de armamento e munições no I.P.T. da Escola Politécnica, entre os quais o Capitão Lúcio Rosales, hoje Coronel Reformado, e a mobilização de esquadrões de cavalaria, qual o famoso Regimento Rio Pardo, que atuou com extraordinário sucesso em vários setores, composto de voluntários com instrutores e enquadramento da Força Pública. Até a improvisada esquadrilha de aviação forneceu a Força Pública oficiais brevetados que serviram às ordens do bravo então Major Ivo Borges.


TESTEMUNHO PESSOAL

A título de testemunho pessoal, prossegue Luís Tenório de Brito:
- Subcomandante do 3º Batalhão de Caçadores, estava eu em Ribeirão Preto quando a 25 de julho, já a minha unidade espalhada, subdividida, sem unidades – recebi ordem telegráfica de vir assumir o comando do 2º Batalhão do Regimento “9 de Julho”, organizado nesta Capital pelo Coronel Domingos Quirino Ferreira, com destemerosa rapaziada de Jaú e da Velha Mogiana – Casa Branca e adjacências, na sua maior parte.
Era aquilo que, certa vez, classifiquei de batalhão de qualidade, composto de engenheiros, médicos, advogados, professores, comerciários, bancários, jornalistas, entre estes Honório de Sylas, o cronista fiel da campanha. Todos, porém, empunhavam o fuzil. Eram soldados rasos.
O enquadramento se deu com pessoal da Força Pública e com aqueles voluntários que iam revelando inatas qualidades militares.
Muitos desses elementos da Força sucumbiram na peleja, podendo citar-se o Tenente Odilon e o Sargento Rosalino, mortos à explosão de uma granada inimiga, na trincheira que defendiam no lugar denominado Saltinho, à margem direita do Paranapanema.


O DESTACAMENTO “TENÓRIO”.

A mesma organização compunha o 6º e o 9º B.C.R. que vieram para o meu comando, constituindo-se então o “Destacamento Tenório”, de acordo com ordem baixada pelo Coronel Milton de Freitas Almeida, Comandante do subsetor, atualmente General do Exército. Quando os contratempos de guerra impuseram a famosa retirada de Apiaí– Vale do Ribeira – Santos, cujos dramáticos lances de sacrifício e de heroísmos magistralmente fixou Honório de Sylas no seu livro “Itararé! Itararé!”, com o 2º de “9 de Julho” marchou a tropa de voluntários que, sob o comando do valoroso Chefe Coronel Barbosa e Silva operava na região de Apiaí e, como todas, intercalada de oficiais e graduados da Força.
Desses elementos fazia parte o aspirante Fausto Querino Simões, hoje Coronel Comandante Geral da Força Pública de São Paulo.
Assim foi a Força Pública, na guerra paulista. Atuou em todos os setores, por toda parte, sustentando o fogo sagrado da luta sangrenta.


FALTOU DIREÇÃO E ESTRATÉGICA.

Contingências inevitáveis, é bem verdade, mas nem por isso menos prejudiciais à eficiência da Força Pública decorreram desse fracionamento. No dia 13, o 3º Batalhão recebera ordens de se deslocar para Ribeirão Preto, que atingiu no dia 15, acantonando a tropa no prédio de um dos Grupos Escolares da cidade. Em Ribeirão Preto perdeu o meu Batalhão grande parte do seu valor combativo, resultante do fracionamento a que se sujeitou, enviando, ora uma companhia, ora um pelotão, até mesmo grupos de combate, destinados a guarnecer pontos da fronteira próxima de Minas Gerais. Na guerra o conjunto é de importância capital. Não só no rendimento da tropa em combate como ainda e, principalmente, no espírito de corpo que aí se revigora em estimulo e solidariedade. Enquadrado o 3º Batalhão por uma oficialidade entusiasta e vibrante, integrada toda ela no alto sentido da Revolução Constitucionalista, sentia-se que duas coisas logo lhe prejudicaram a ação: o fracionamento e a tendência, logo concretizada, de caráter defensivo da luta. Defensiva e inércia, é antecâmara da morte. E foi o que infelizmente aconteceu. O colapso da Revolução Constitucionalista ocorreu por falta de movimento ofensivo. A divina loucura coletiva de São Paulo, como alguém classificou o levante piratiningano, contra a ditadura inepta e corrupta, faltou estratégia à altura do ímpeto inicial.


EFETIVOS REVOLUCIONÁRIOS.

A quanto se elevaram os efetivos revolucionários de São Paulo?
O Coronel Luís Tenório de Brito responde:
- Não há precisão absoluta. Duvido mesmo que alguém chegue a um resultado preciso. Pelo número de voluntários que integraram as unidades conhecidas – algarismos nunca uniformes – poder-se-á oferecer a média de 300homens para cada batalhão. Assim por volta de 20.000 terá andado a mobilização civil, no movimento constitucionalista.
O General Manoel Rabelo, que fora interventor em São Paulo antes de Pedro de Toledo, calculava a soma de 22.395 voluntários. Segundo seu raciocínio, 10.200 foram contribuição da Força Pública e 3.612 a parte do Exército que aderiu ao movimento no Estado. Assim, o total atinge a 36.207 combatentes. A Força Pública, pois terá concorrido com 28 por cento da tropa em ação, se considerarmos os algarismos expostos.



MORTOS DE SÃO PAULO NA REVOLUÇÃO.


Referindo-se ao livro Cruzes Paulistas, que resume a biografia de cada um dos que tombaram em 1932 por São Paulo, o Coronel Tenório de Brito informa:
- Lá estão alinhados 630 nomes, colhidos em todos os campos da luta gigantesca, entre as mais diferentes organizações militares que viveram o drama paulista daqueles dias inesquecíveis. Expressiva, sem dúvida, é a contribuição da Força Pública de São Paulo na gloriosa estatística. Elevam-se os seus mortos à soma de 194 homens ou 34% do total de mortos. Entre eles contam-se 9 oficiais inclusive o Comandante Geral, Coronel Júlio Marcondes Salgado, 3 alunos oficiais e 48 graduados (Cabos e Sargentos).
A Força Pública cumpriu com denodo, eficiência e espirito de sacrifício seu dever na grave conjuntura.
Sem armamento adequado e em déficit de munições, enfrentou ela adversário aguerrido infinitamente superior em número, bem enquadrado e dotado de abundante, moderno e variado material de guerra. Manteve a um tempo, nos três meses de luta, o equilíbrio em todos os setores de combate, enquadrou com elementos seus corpos de voluntários por ela postos em ação e conservou o fogo sagrado da luta nas mais ásperas frentes de batalha que lhe foram confiadas – até a completa exaustão dos elementos materiais – contingência a que São Paulo não pode fugir, sitiado que se viu desde os primeiros dias da Revolução.





 





Metralhadora em ação
 protegida pela perfeita camuflagem







 







 








Cel. Júlio Marcondes Salgado passa em revista as tropas.







 



A seguir algumas imagens da Força Pública em ação, em diversos setores




 






 










 






 



Fonte.

Edição Especial do jornal Diário da Noite de 9 de julho de 1957. (Arquivo pessoal).





Editado e publicado por Maria Helena de Toledo Silveira Melo.
12/04/2018



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