sábado, 17 de fevereiro de 2018

“EU FUI DO 1º BATALHÃO DO REGIMENTO 9 DE JULHO”.








O toque impressionante do milagre na fuga de um Soldado Constitucionalista da Batalha de Amparo, cativo com toda a vanguarda de seu Batalhão.




No dia 13 de julho, (era um dia claro e seco) seguia o 1º Batalhão do “Regimento 9 de Julho”, sob o comando do Capitão Labiano (ou Fabiano) Dias, militar bravo e decidido da Força Pública, rumo ao Setor Bandeirante.  “Eu ia com esse Batalhão, mas não me destaque dos companheiros, porque fui igual a todos...” Pede Luís Araripe Sucupira.
Atingiram Santa Rita da Extrema. E foram além, penetrando Camanducaia até Cambuí, perto de Paraisópolis, em Minas Gerais. O Batalhão, organizado e patrocinado pelo então Instituto do Café, do qual era presidente o nortista Luís Américo de Freitas, constituía-se de perto de 600 moços, de 23 a 28 anos, mas eu era mais velho, e por ter sido aluno do Colégio Militar, deram-me o posto de Tenente.
O Batalhão que seguira de trem até Bragança e daí a pé, por léguas e léguas até Cambuí, recebeu ordem em setembro de recuar até Amparo, afim de atacar, nesta cidade, as forças comandadas pelos então Coronel Eurico Dutra, Cel. Teixeira Lott e Benjamim Vargas. Travou-se a batalha no dia 18 de setembro, às 6 horas da manhã, dando-se o ataque no minuto exato da rendição de tropas. A investida fulminante do 1º Batalhão, que levou o fogo até o cemitério de Amparo, quase forçava as forças federais à retirada. Mas fez-se sentir o contra-ataque, passada a emoção da surpresa e a luta terminava sete horas depois, por falta de munição.
- Foi um combate heróico, no qual todos os paulistas mostraram grande coragem. Se não faltassem armas, não há dúvida que tomaríamos Amparo mas...seria inútil porque as forças federais eram muitíssimo mais poderosas.
Morreram 30 paulistas e a guarnição integral de metralhadoras da Força Pública foi destruída. A vanguarda, que conseguira proteger a retirada das tropas da retaguarda, foi cercada e feita prisioneira: Eu estava entre os 216 prisioneiros, cativos de ex-colegas e íntimos amigos meus, do Colégio Militar, entre eles o então Major Aristóteles de Souza Dantas, hoje General.
Por coincidência, morava em Amparo o irmão de Luiz Araripe Sucupira, o delegado Antônio Araripe Sucupira. A sua casa defrontava o Quartel General onde se aquartelava o Estado Maior. Embora Antônio não fosse soldado, suspeitaram dele pelo parentesco com o Tenente Araripe. Prenderam-no como espião, mandando-o, juntamente com os demais prisioneiros para o Rio.
Como tínhamos de fazer muitos quilômetros à pé, valendo-me da antiga amizade que tinha com Teixeira Lott, pedi-lhe que transportasse, em seu automóvel a mala de meu irmão. Aquiesceu.
As forças federais puseram os prisioneiros no trem. E fomos os primeiros a passar pelo Túnel, já em mãos dos adversários, após os combates memoráveis do Exército Constitucionalista. A viagem durou três dias. Meus companheiros ficaram em Ilha das Flores. O então Major Edgar Amaral, presentemente General, determinou que eu ficasse em Rezende, por ter sido seu colega. Eu era ainda para eles o 67: não se esqueciam do nosso convívio no Colégio Militar. Tratavam-me, dentro do possível, com afeto, desculpando-se: - Sentimos muito 67, tê-lo como prisioneiro de guerra.
Mandaram que um aspirante o acompanhasse pela litorina até o Quartel General do Rio. A movimentação aí, era enorme, com tropas de prontidão, e soldados dormindo até nas escadarias. Chegamos ali entre 11 e meia noite. Eu devia prestar declarações diante do Estado Maior. O Capitão a cuja presença fui levado, pediu-me que declinasse o nome e a idade. Respondi: Devo estar completando 40 anos de idade; e acho que por isso mereço a liberdade.
Ele retrucou que a liberdade não me daria e sinto muito, 67; faça-nos as suas declarações. Declarei então, erguendo a voz em desafio, que os federais jamais conseguiriam entrar em São Paulo pois as paulistas e as crianças os receberiam com bombas de ácido sulfúrico.  - Ácido Sulfúrico? interromperam os oficiais. E o Capitão, apavorado levou-me até o General, no andar superior. A oficialidade, cercando-me, fez festa, e todos quiseram ver os bonés que tirei dos bolsos para mostrar-lhes. Exclamavam:  - Os paulistas são formidáveis. A voz do General fez-se ouvir. Pode ir, 67. E eu fui. Fui descendo as escadas.



A FUGA EMOCIONANTE.


O Capitão que o levaria até o General não o aguardava. E ele continuou descendo por entre oficiais e soldados armados. Vi-me, enfim, no pátio interno do Quartel, com a minha capa gaúcha, a minha barba cavanhaque, sujo de muitos dias sem banho. E ouvia ressoando a voz do General: - Pode ir, 67... pode ir. Será que posso? Será que Deus me concederá a liberdade neste dia de meu aniversário? Apertei com as mãos a oração de Santa Catarina que eu guardava junto ao coração. Fôra herança de meu pai essa relíquia santa, e o acompanhará por toda a Guerra do Paraguai. Acompanharam-me também na Causa de São Paulo. Balbuciando a reza, afrontei as duas metralhadoras cruzadas e... franqueei o portão. A Guarda do Quartel General do Exército prestou continência a mim, o Soldado Constitucionalista, o prisioneiro que alcançava a liberdade. Olhei o relógio, já na rua: eram dois minutos de 25 de setembro, dia do meu aniversário!




A CAUSA ESTÁ PERDIDA!


Fui andando a pé até a sede do Flamengo, que fazia frente com o Palácio Guanabara, transbordante de soldados e fuzileiros navais. Um automóvel passa faz a volta completa e para na minha frente, Estou frito, desta vez vão prender-me! – penso. Desceu o Floriano, goal-keeper do Flamengo; o outro seguiu, era o Silvio Pessoa, da Polícia.
Ele diz ao Floriano: - Abra-me a porta, eu sou um paulista fugido. A porta abriu-se, e o Flamengo agasalhou o Tenente. Eram duas horas da madrugada. Todos que dormiam lá dentro, acordando, quiseram saber:
- Como vai o Movimento de São Paulo?
Luís Araripe Sucupira vendo-se entre amigos, baixou a cabeça, e desta vez respondeu:
Está tudo perdido! 

Transcrição do texto da reportagem de Margarida Izar, publicada no jornal Diário da Noite em 1957.





Luís Araripe Sucupira com dois companheiros, na véspera da violenta
Batalha de Amparo, no dizer do "Correio da Manhã", de 3 de outubro de 32 -
" as metralhadoras funcionavam vinte e ensurdeciam as descargas dos fuzis."

















As imagens acima são as que acompanhavam a matéria, as fotografias referem-se à Batalha em Amparo, SP, a ilustração é de PUIG.





Fonte.

Jornal “Diário da Noite”, Edição Especial de 09 de julho de 1957 (arquivo pessoal).




Editado e publicado por Maria Helena de Toledo Silveira Melo.
17/02/2018.



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