segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

Cartas do Soldado Sylvio Galvão de 1932.

 

 Sobre Sylvio Galvão, encontrei no “Blog do Delmanto”, em Revolução Constitucionalista de 1932 & a Participação de Botucatu! este trecho, transcrito abaixo, que descreve bem a grandeza deste Herói de 32:

Em memorável artigo, sob o título de “Honra ao Mérito”, publicado no jornal “Correio de Botucatu”, de 22/07/1932, o ilustre magistrado destaca o perfil dos principais líderes na mobilização da juventude, com credibilidade, civismo e competência:

“O exemplo, que vou citar, é digno de registro e louvor públicos.

Assim que irrompeu no Estado o movimento cívico a que assistimos, Botucatu, como se lembram, fremiu de entusiasmo, numa congregação de todas as suas forças, para os preparativos da luta, a que não podíamos deixar de concorrer.

À frente da propaganda patriótica que urgia empreender; puseram-se logo dois expoentes da nossa intelectualidade.

Uniram-se, captaram outros elementos de influência; organizaram e logo entraram a executar um programa de ação, vasto, multiforme e trabalhoso. O resultado está na memória de todos: alistamento, comícios, predicas cívicas e toda sorte de atividades em prol da causa sagrada.

Nos comícios, notadamente, foi preponderante o papel desses moços, pelo prestígio e fecúndia do seu verbo. Oradores completos, no fundo e na forma, as suas orações calavam, seduziam, arrastavam e estimulavam a palavra de outros. Nesse terreno, o que se viu foi uma verdadeira batalha de eloquência, soberba de frutificação.

Um dia, soube que os dois arautos iam partir, incorporados aos reservistas da terra. Sobressaltei-me ante a visão da lacuna sensível que íamos sofrer. Temi um esmorecimento no nosso trabalho de predicação cívica, necessário ainda para manter viva a chama patriótica em todas as camadas populares.

E porque assim pensei, resolvi intervir, procurando primeiro as autoridades militares, a ver o que era possível no sentido de retardar um pouco a partida dos dois moços. E fui feliz nesse primeiro passo. De inteiro acordo os chefes militares, subordinaram o caso unicamente à vontade dos dois interessados.

Fui, então, a eles, a cada um de per si, reservadamente. Expus-lhes a minha opinião, com os argumentos superiores que me animavam. Mostrei-lhes quanto a sua colaboração aqui, no trabalho que iniciaram e deviam prosseguir, pela palavra e pela pena, era indispensável, e muito mais eficiente e real, incomparavelmente que o tributo das armas, a que se propunham. Não se tratava de furtá-los, por sentimentalismo de amigo ou admirador, aos azares da guerra. Meu escopo era mais nobre, justo, superior, pois visava não perdermos aqui dois elementos à mantença do fogo sagrado. Nem só de soldados se precisa nos momentos como este, máxime quando há pletora de guerreiros.

O concurso intelectual, o trabalho da pena e, sobretudo, a força da palavra, são inestimáveis. Isso, o que estamos vendo na Capital, onde a flor da intelectualidade paulistana está a postos, dia e noite, na imprensa, na tribuna, nos comícios, nos microfones, em suma, no trabalho de exortação cívica, sem a qual pouco conseguiria a materialidade da guerra.

Enfim, fui eloquente como pude para atingir o meu desideratum.

Ouviram-me, entre sensibilizados e modestos. Afinal, quando lhes coube opinar, não hesitaram, e a resposta, de um como de outro, foi uma só:

- “Dr., impossível acatar o seu apelo. Sentimos, não apenas pensamos, sentimos necessidade de partir, isto, em nós, é superior às razões que o Dr. nos apresenta, a despeito da superioridade bondosa em que são calcadas. Preferimos seguir. Talvez a nossa utilidade nas fileiras seja mesmo menor do que aqui. Mas, já demos um pouco da nossa inteligência à causa que esposamos. Queremos, agora, dar largas ao coração...

E assim foi que partiram esses dois moços que se chamam SYLVIO GALVÃO e AMARAL WAGNER.

Se já eram grandes no meu conceito, agigantaram-se agora.

 





Pesquisando ainda, sobre o Soldado Sylvio Galvão encontro uma referência a ele em uma palestra ocorrida no dia 10 de setembro de 2019, no Instituto de Biociências da Unesp em Botucatu, proferida pelo Professor Ricardo Galvão, físico, engenheiro, integrante da Academia Brasileira de Ciências, professor titular do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e Neto do nosso Herói de 32, disse o seguinte ao final de sua explanação:

O maior equívoco de quase todos os governos no Brasil é o de ignorar os conhecimentos científicos para a tomada de decisões e o desenvolvimento de políticas públicas eficientes.

O País vive um momento de “obscurantismo” temeroso que precisa ser enfrentado pela sociedade. “A Ciência não pertence à direita ou à esquerda. Não devemos deixar que nossas convicções políticas e ideológicas turvem nossos olhos quando estamos tratando de Ciência. Infelizmente o ignorante é soberbo. Por isso não podemos dar opiniões gratuitas ou responder de maneira superficial. Mas sim com Ciência. Não acredite em super-heróis ou mitos”, enfatiza o professor, que se emocionou ao final da palestra ao ler um texto sobre a mobilização de Botucatu na Revolução Constitucionalista de 1932, na qual teve participação importante de seu avô, professor Sylvio Galvão. “Aprendi com ele a não fugir ao bom combate”, finaliza.

A palestra completa do professor Ricardo Galvão no Instituto de Biociências da Unesp em Botucatu pode ser visualizada na íntegra no canal da Agência de Divulgação Científica do IBB, no Youtube.

 

 


Voluntários de Botucatu.


Transcrevo, a seguir, parte do artigo que foi publicado no Jornal Tribuna do Norte, em 1ºde setembro de 2020, tendo como autor Altair Fernandes Carvalho. Interessantes as cartas escritas pelo Soldado Constitucionalista Sylvio Galvão à sua amada Maria, escreveu das trincheiras onde combatia.

Cartas escritas nas trincheiras, durante a Revolução Constitucionalista de 1932, lá onde os paulistas enfrentaram os irmãos em nome de uma Constituição para o Brasil. Seu autor, embora não tenha sido pindamonhangabense (era de Botucatu) teve uma relação histórica com este município. Foi um dos formandos da turma de 1920 da Escola de Farmácia e Odontologia, a primeira faculdade de Pindamonhangaba.

Infelizmente nosso material não é quantitativo nem tem qualidade. São cópias xerocadas, quase apagadas, de cartas enviadas pelo doutor (também era advogado), professor e poeta Sylvio Galvão, a sua esposa a qual ele amorosamente tratava de Maria…

Pesquisando, constatamos que as cartas na realidade eram cartões distribuídos à tropa. Identificados pela patriótica frase “Tudo por um São Paulo forte no Brasil Unido” e a denominação Correio Militar MMDC, traziam ilustrações nas quais se destacavam as bandeiras paulista e brasileira e o combatente constitucionalista, com espaço para o nome do batalhão e do soldado. O local destinado à escrita ficava entre duas frases; acima, um estímulo: “O entusiasmo das tropas apressa a vitória”; abaixo, no final desse espaço, um pedido: “Pais, mães, irmãos, amigos escrevei aos vossos soldados queridos despertando-lhes o entusiasmo”.

Da correspondência de Sylvio Galvão a sua amada, tivemos acesso a algumas mensagens enviadas da frente de batalhas onde ele se encontrava. As transcrevemos a seguir, numa sequência baseada nas datas em que foram escritas.

 

 

Fazenda Retiro,

24 de julho de 1932

 

Maria…

Que saudade bravia! A quietude das trincheiras pelo ‘front’, como dizem, dá-nos a ilusão de que a luta terminou. Soube agora mesmo que me enviaste o dinheiro pedido.

Obrigado

Sylvio

 

 

Fazenda Boa Vista,

21 de agosto de 1932

 

Maria…

Escrevo-te da trincheira. A minha escrivaninha é o fundo de um prato. Lindo lugar onde estamos. Verdadeiramente lindo. À esquerda, a cavalaria escura dos picos da Mantiqueira, a menos de um quilômetro à frente. Atrás, e à direita da casa da fazenda, a cerca de 200 metros, um panorama surpreendente… é um lençol amarrotado de morros em plano inferior, cambiado do azul escuro ao verde, vermelho, amarelo… Lá adiante, o cruzeiro, à noite, visto daqui, é uma joia constituída de diamantes. Pouco adiante de nós, está Atibaia, invisível daqui. Dos homens que vieram comigo poucos ainda me acompanham. O nosso batalhão é extraordinário de resistência. Existem destacamentos dele por toda a parte desta região. Muitos dos prisioneiros nestes últimos dias foram feitos por nossa gente. No domingo passado assistimos a um belo combate de aviões sobre o morro onde estávamos: dois contra dois.

A saudade por aqui “urra na caixa do peito”. E o frio! Cruzes! Chuva todos os dias!

Adeus, abraços do Sylvio

PS. Lulu está aqui e vai bem

 

 

Fazenda Retiro,

23 de agosto de 1932

 

Maria…

Não se impressione com a falta de notícias. Quando elas faltam é porque tudo vai bem. No momento em que escrevo, por exasperação, não se ouve um só tiro, nem longe nem perto. Telegrafei há dias, pedindo-lhe mandasse 100$000, mas parece que você não recebeu o telegrama. Perdi a carteira com 90$000.

Adeus, abraços do Sylvio

 

 

Pinheiros,

26 de agosto de 1932

 

Maria…

Tenho uma vontade doida de conversar com você pelo telefone, mas… talvez só possa ir a Cruzeiro amanhã. As mulheres paulistas têm sido admiráveis em dedicação; mas falta ainda uma coisa: é empurrar para as trincheiras muita gente fardada que se exibe pelas cidades. É fácil conhecer os verdadeiros servidores da nossa causa. Eles têm três diferenças infalíveis: barba, sujeira e carrapatos. Soldado bonito nunca deu tiro.

Adeus. Abraços do Sylvio.

 

Trincheira da Matta,

29 de agosto de 1932

 

Maria…

Suas cartas têm-me chegado com 15 a 20 dias de atraso. Ainda hoje recebi um bilhete postal datado de 15 do corrente. Às duas horas você deve estar em Botucatu, se é que não resolveu aproveitar mais a oportunidade do passeio. Eu continuo aqui. Já me sinto cansado. A sujeira também cansa. Aqui não há novidades. Neste momento, aviões nossos lançam cerca de trinta bombas sobre o inimigo. Entre a nossa gente e a das trincheiras da frente há troca há troca de “amabilidades” de fuzil e de boca.

Adeus. Abraços do Sylvio

 

 

Trincheiras do Piaguy,

27 de setembro de 1932

 

Maria…

Quisera celebrar meu aniversário em casa, mas não é possível, pelo que vejo. Celebro-o aqui mesmo. O inimigo está “camarada”. Ante ontem os nossos foram esfogueteá-lo nas suas trincheiras! Aqui, somos onze “valientes” sendo a maioria de estudantes.

Adeus. Abraços do Sylvio

 

 

Trincheira do Piaguy,

28 de setembro de 1932

 

Maria…

Trinta e quatro anos hoje. Não podendo celebrar a data com vocês, celebro-o com a minha família daqui, onde estão o Luís, o Serrador, o Paulo Moreira Barbosa, o (nome ilegível na cópia da carta), o Jordano, o (outro nome ilegível) e outros. O Liacca e o Serafim chegaram hoje. Recebi a carta que este trouxe e o dinheiro. Estou bem de finanças.

Obrigado e adeus. Abraços do Sylvio

 

 

Trincheiras do Piaguy,

29 de setembro de 1932

Maria…

Nada de novo na frente do Paraíba… É só o que lhe posso contar a respeito do que se passa. Tenho um palpite de que estamos no fim. E Deus permita que assim seja, pois já não aguento mais de saudades. Meu coração festeja esta possibilidade meio tola…

Adeus. Abraços do Sylvio.

 

 

 

Em 1932 a casa do Dr. Sylvio Galvão, em Botucatu, serviu como um pequeno quartel general, para apresentação de voluntários e recebimento de auxílios para o movimento constitucionalista. Numerosos botucatuenses se incorporaram aos Batalhões do Exército, da Policia e de Voluntários.

Pelas localização, nas cartas, Sylvio Galvão lutou nas imediações da Frente Pinheiros, na região de Cruzeiro e Túnel da Mantiqueira. 

Considero estas cartas de grande valor histórico.

Honras ao Herói de 32!




Nas imagens, alguns cartões postais e informativos, distribuídos pelo Correio Militar M.M.D.C.


















Fonte.



4 comentários:

  1. PARABÉNS MARIA HELENA. ACABO DE COLOCAR EM MEU BLOG "MEMÓRIAS DO VENTURA".

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  2. Espetacular, Maria Helena. Vou procurar fazer o mesmo com as cartas que meu avô Alceu mandou à minha avó Maria durante a Rev.
    Gostaria de saber como publicar dessa mesma forma... Abs
    Ao Cel Ventura, o meu saudoso abraço!!

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  3. Obrigada!
    Acho excelente que publique as cartas de seu avô.
    Por meio de cartas conseguimos informações importantes sobre o Soldado e também sobre a Revolução.
    Se tiver interesse posso publicar também.
    Abraços

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