domingo, 18 de outubro de 2020

VOLUNTÁRIO CLEMENTE PEREIRA.

 

Neste texto, escrito por Marcelo de Campos Pereira, filho do Voluntário Clemente Pereira, ele relata a participação de seu pai na Revolução Constitucionalista de 1932 e também da sua família, que teve participação na retaguarda.





HISTÓRIA DA FORMAÇÃO ESCOLAR DE UM CIENTISTA NUM PERÍODO DE TRANSIÇÃO DA CIÊNCIA BRASILEIRA, título e trecho pertinente à sua participação na Revolução de 32, da entrevista concedida por meu pai, Clemente Pereira, ao jornal Folha da Manhã, em 11/01/1953.






O cientista, como cidadão que é, não pode deixar de ter atitude política; do contrário, transformar-se-ia em mero parasito da sociedade. Em 1932, ao saber, pelos jornais, dos intuitos da Revolução Constitucionalista, não tive a menor dúvida em trocar o microscópio pelo fuzil, no Batalhão Fernão Dias Paes Leme  (em Cruzeiro, a assim denominada "Capital da Revolução"), para tentar devolver a liberdade à nossa terra (o Batalhão Paes Leme, sob o comando do Major Antonio Pietscher, que atuou por todo o Setor Leste, inclusive nas batalhas de Eleutério e Gravi, é considerado um reduto de heróis, um dos que cobriram a Bandeira das Treze Listas de glórias no ano de 1932).

Para quem não sabe, os primeiros batalhões paulistas que seguiram para o "Setor Leste" ou a "Frente Leste", tiveram seu "batismo de fogo" já na primeira semana de guerra. Segundo relatos historiográficos, os conflitos ocorridos naquela região foram os mais longos e violentos, tornando as imagens relativas a essa frente de batalha umas das mais representativas da Revolução Constitucionalista de 1932. O Batalhão Fernão Dias, formado por voluntários e organizado pelo Dr. Fernão Salles, havia entrado em Ouro Fino - MG sob o comando do capitão Antônio Pietscher, o grande herói do Setor Leste, cantado em prosa e verso e assíduo frequentador da casa de meus avós, na Rego Freitas, número 35.

PAULISTAS ÀS ARMAS!!!!!!!!!!!













Em 1932 toda minha família engajou-se, pela defesa dos ideais constitucionalistas e de nosso Estado. Infelizmente, hoje, falta idealismo no país, um sentimento que poderia nos levar a pensar no coletivo em primeiro lugar. Lamentavelmente, prevalece entre nós um equivocado espírito de salve-se-quem-puder. Uma atitude que nos faz considerar fora de moda valores como patriotismo e nacionalismo, sempre necessários e sadios, desde que não confundidos com ufanismo, e essenciais para a união de qualquer país em torno de objetivos comuns, seja na guerra, seja na paz.

Na ocasião, meus pais estavam noivos. Minha família materna é de Jundiaí e, em 32, minha mãe, a mais velha de seis irmãos, lá residia com eles e meus avós. Em julho, ao ser deflagrado o conflito, meu pai, que morava em São Paulo (no antigo Viaduto do Chá), partiu para a cidade de Cruzeiro, onde permaneceu até o término da Revolução, em outubro. Minha mãe, em Jundiaí, juntamente com as mulheres da sociedade local, ajudava na confecção dos uniformes e dos agasalhos. Um dos irmãos da minha mãe, Moacyr Santos de Campos, então com 18 anos, partiu para a frente de combate, sem titubear. Meu avô, João Firmino de Campos, farmacêutico em Jundiaí e Chefe das Farmácias da Companhia Paulista de Estradas de Ferro, foi Presidente da Casa do Soldado, visitando constantemente as frentes de combate, levando correspondência, medicamentos, agasalhos, cigarros, alimentos, enfim, sempre procurando levantar a moral dos soldados através de sua palavra, espiritualista convicto que era, além de ter pertencido aos mais altos escalões da Maçonaria. Um dos irmãos mais novos do meu pai, João Pereira Júnior, com 20 anos e no segundo ano de Medicina, segue para o front, sob as bênçãos dos meus avós. Outro irmão, Rodovalho Pereira, então com 16 anos, ficou para cuidar da mãe e da irmã, pois meu avô viajava com frequência.

Meu pai, recém-formado em Medicina - mais uma vez destaco o trecho de sua entrevista -, não teve a menor dúvida em trocar o microscópio pelo fuzil, no Batalhão Fernão Dias, para tentar devolver a liberdade à nossa terra. Na penúltima fotografia, meu pai, Clemente Pereira, em Cruzeiro, é o único de poncho. Esse Batalhão, sob o comando do Major Antonio Pietscher, que atuou em todo Setor Leste, inclusive nas batalhas de Eleutério e de Gravi, é considerado um reduto de heróis, atuando como ponta de lança contra as forças federais getulistas do Rio de Janeiro. A formação médica do meu pai permitiu que inúmeras vidas fossem salvas e, quando necessário foi, empunhou suas armas. Hoje é considerado um dos heróis de 32, fazendo jus à homenagem prestada pela Prefeitura de São Paulo junto ao túmulo familiar, no Cemitério da Consolação, preservada, tanto através da tag QR CODE como pela placa de identificação. Como dizia Albert Szent-Gyorgyi (1893 - 1986), Prêmio Nobel de Medicina de 1937: Se quisermos olhar e enxergar à frente, devemos olhar para trás.





Textualmente, em carta dirigida à sua irmã Alice, ao relatar esse fato, diz: Já passei a primeiro sargento 'por ato de braveza', mas sem fazer nada de especial. Em situações de alto risco à sua própria integridade, sua imensa e patente modéstia ficou registrada. Em correspondência à minha avó, relatou que tinha sido promovido por atos de heroísmo...e que recusou a honraria por achar que apenas cumpria sua obrigação de paulista...geração de têmpera forjada em aço.

Tradições democráticas de São Paulo, que foi grande porque sempre quis que o Brasil fosse grande... De Mogi a Cruzeiro, no Túnel, em Silveira e em todas as frentes de combate, o paulista, lutando contra todas as vicissitudes, contava apenas com o apoio material restrito que lhe era fornecido e também com o formidável apoio moral que lhe deu o povo bandeirante. Essa singela e emocionante carta, valiosa relíquia de 32, retrata o apoio de um funcionário do Instituto Biológico de São Paulo, Jayme Ferraz, aos seus amigos, por acaso seus chefes no Instituto, meu pai, Clemente Pereira e o futuro idealizador da UNICAMP e da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Zeferino Vaz, que participavam como médicos voluntários no Batalhão Fernão Dias Paes Leme, em Cruzeiro. Suas palavras retratam a preocupação para com seus amigos e o ardoroso clima de patriotismo vigente. Paulistas, antes de tudo.

Em razão da convulsão social, os correios funcionavam precariamente. Meus pais trocaram extensa correspondência, boa parte perdida sabe-se Deus onde. Hoje faço questão de divulgar uma das cartas. Muito mais do que algo estritamente pessoal, hoje, após 86 anos, as mensagens tornaram-se parte da história do Estado de São Paulo e, por extensão, do Brasil. Mostram o clima de ansiedade, de preocupação e de intenso patriotismo vivido por um casal apaixonado, em tempos de guerra. Espelha o retrato de uma época, num determinado e decisivo momento. A belíssima e inconfundível caligrafia da minha mãe, a delicadeza das colocações, a demonstração do amor maior vivenciado pelo jovem casal, tudo isso integra o patrimônio dos paulistas e dos brasileiros. Que frutifique sempre o exemplo deixado por eles. Que o espírito de 32 inspire os jovens de hoje!!!



























 Na foto, a placa que era colocada no batente da porta de entrada das casas dos constitucionalistas (no caso, na casa dos meus avós, em Jundiaí) e o "pin" usado na lapela do paletó (um dos modelos). 




Ao som da marcha Paris-Belfort foi noticiado o falecimento dos quatro primeiros heróis constitucionalistas: Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo (MMDC). Durante todo o período da Revolução Constitucionalista, no horário das 2 às 4 horas da madrugada, notícias sobre o desenvolvimento da revolução e mensagens de civismo, com aclamação do espírito patriota conseguiam contornar a censura de Vargas e chegar aos lares paulistas.

 

 




 Capacete, o Diploma e Medalha  de Participação da
Revolução de 1932 de Clemente Pereira








Clemente no Viaduto do Chá, São Paulo, SP.







Rodovalho Pereira.


Publicado, texto e fotografias, com autorização do autor – Marcelo de Campos Pereira.

 

Editado por Maria Helena de Toledo Silveira Melo.


terça-feira, 13 de outubro de 2020

IBIRAPUERA – PANTEON DE HERÓIS.

 

No dia 10 de Julho de 1958, o jornal A Gazeta estampa, na primeira página, uma grande fotografia, mostrando os participantes da cerimônia em homenagem aos Heróis de 1932, realizada no dia anterior. 





Com a seguinte legenda:

O 9 de Julho, data sagrada, vive no coração dos paulistas e 26 anos depois da epopéia que marcou o gesto de dignidade da gente bandeirante, com o mesmo fervor dos primeiros instantes, os fiéis continuam a prestar, aos que se partiram, levados nas asas da glória, a homenagem da sua gratidão que não morre e da sua saudade sempre renovada. Ano após ano, e um punhado de cada vez, os mortos imortais são levados para o Monumento do Ibirapuera. Eles que lutaram em todas as trincheiras ali são reunidos no grande recinto que o povo lhes construiu...

Na imagem foi mostrada uma visão geral do instante que se procedia a chamada dos nomes daqueles que deviam recolher ao cenotáfio os restos mortais dos heróis chamados este ano. Aparecem as urnas e os fiéis, os que sabem guardar, no amor à terra, os que lidaram, por ela, no amor à liberdade!

 


Desfilam os veteranos. Cerca de dois mil veteranos, no maior desfile já realizado pela Associação dos Veteranos de 1932, homenagearam seus irmãos de armas tombados nos campos de batalha pela constitucionalização do país, regando com seu sangue generoso uma das mais belas páginas da história de São Paulo. Cabeças erguidas, olhar altivo, coração batendo firme, postaram as continências de estilo àqueles que descansam no Monumento Mausoléu, do Ibirapuera.

 

 





Legenda da Missa na Catedral Metropolitana-

 

Ás 8 horas de ontem, na Catedral Metropolitana, foi rezada a missa por intenção dos combatentes que tombaram nos campos de batalha de 1932, na presença das mais altas autoridades do nosso mundo governamental e social, além de veteranos ex-combatentes e grande massa de público. O oficio religioso foi realizado pelo Padre Luiz de Abreu ausência forçada de Dom Paulo Rolim Loureiro, bispo auxiliar de São Paulo, cognominado justamente o “Bispo da Tradição”. A cerimônia religiosa foi mandada celebrar pela Associação dos Veteranos de 1932, M.M.D.C., e pelo Clube de Piratininga. Participou o Governador Jânio Quadros e o Brigadeiro Armando Ararigboia.

 








Legenda da foto

São Paulo todo reverenciou, com presença de seus representantes mais lídimos a memória dos heróis que tombaram nos campos de batalha, em defesa da Constituição de 32. A Missa, foi mandada celebrar, na Catedral Metropolitana, pela Associação dos Veteranos de 1932 – MMDC e pelo Clube de Piratininga, às 8 horas de ontem. Na escadaria, um Batalhão de Guarda da Força Publica, em uniforme de gala, prestou as homenagens aos heróis com três salvas de fuzil. Dois mil voluntários assistiram o Réquiem em intenção da alma daqueles Soldados da Lei que tombaram em defesa da nossa Liberdade. Na imagem, as solenidades em frente à Catedral, momentos antes das urnas serem transladadas para o Monumento Mausoléu no Ibirapuera.

 











São Paulo não esquece seus Heróis!

Alta lição de civismo fez vibrar a Capital Paulistana.

São Paulo vibrou ontem, desde as primeiras horas da manhã, com o toque da alvorada, às 7:30 horas no Largo São Francisco, organizada pela Associação dos Veteranos de 1932, MMDC, comemorando o 26º Aniversário da Revolução Constitucionalista de 1932, a epopéia paulista pela Liberdade e que marcou época em nossa história pátria, pelo desprendimento de seus filhos pela luta em prol da constitucionalização do Brasil. O povo de São Paulo demonstrou, em soberba festividade cívica, que seus combatentes, caídos em campo de batalha, não deram em vão suas vidas pela causa da Lei.

O interior paulista também se associou a essas homenagens, rendendo tributo de saudade e respeito àqueles que se sacrificaram para que a dignidade, a honra, a liberdade de pensamentos fossem defendidas mesmo com o seu generoso sangue derramado.

Na cerimônia pudemos notar a presença do Governador do Estado, Jânio Quadros; o Prefeito da Capital, Adhemar de Barros; Comandante do II Exército, General Porfirio da Paz; Comandante da Força Aérea, Brigadeiro Armando Arargboia; General Nestor Penha Brasil, Comandante a 2ª Divisão de Infantaria, demais autoridades civis e vários do Clube Piratininga e da Associação dos Veteranos de 1932 – M.M.D.C., veteranos ex-combatentes tombados em campo de batalha, e que seriam transladados para o Mausoléu do Ibirapuera:

Coronel Romão Gomes – Força Pública

Capitão Sylvio Fleming – Exército

Voluntário José Vicente Ferreira

Major José Marcelino da Fonseca

Tenente Francisco de Paula Pacheco Colli – C.P.O.R.

Engenheiro Lauro de Barros Penteado

Major Aviador Ismael Torres Guilherme Cristiano – Força Pública

Voluntário Ary Cajado de Oliveira – 2º R.C.D. do Exército

Voluntário José da Costa Junior

Orlando de Oliveira Alvarenga

Voluntário Rubens Fraga de Toledo Arruda

 

As legendas são as originais publicadas no jornal.

 

Fonte.

Jornal “A Gazeta”, 10 de jul.de 1958 (Coleção pessoal).

 

 

Editado e publicado por Maria Helena de Toledo Silveira Melo

sexta-feira, 2 de outubro de 2020

DIA DA CESSAÇÃO DAS HOSTILIDADES.

 


No dia 2 de outubro de 1932 foi assinado um acordo, entre os Chefes Militares e Governo, encerrando-se a luta armada.

O acordo militar não foi assinado por todos os chefes militares constitucionalistas, uma vez que a intenção de suspender as hostilidades não fora previamente discutida e aprovada. Fora iniciativa do General Klinger, que enviara seus representantes ao General Góes Monteiro.

88 anos se passaram, daquele dia, mas a Revolução Constitucionalista mantem-se viva no coração da gente bandeirante. Uma lição e um exemplo de coragem cívica de quanto é capaz a reação de um povo afrontado nos seus ideais democráticos.

 


A ilustração é a representação do povo paulista.





O telegrama informando a Cessação das Hostilidades.


Carta do Cel. Euclydes de Figueiredo e Gen. de Brig. Bertholdo Klinger:

 

Ao Sr. Dr. Getúlio Vargas

Chefe do Governo Provisório do Brasil

Nós, os signatários desta, no caráter de Chefes Militares e organizadores do Movimento Constitucionalista deflagrado em São Paulo a 9 de Julho último, com repercussão em Mato Grosso, vimos perante V. Exa. e demais autoridades da República às quais o caso afete, declarar que assumimos a plena e exclusiva responsabilidade por todos os acontecimentos constitutivos daquele movimento armado e dele decorrentes. Esta nossa declaração formal foi até hoje retardada porque, para faze-la estávamos aguardando a oportunidade que nos seria proporcionada quando fossemos a depor sobre os fatos em causa; como, porém, esta ocasião não mais se dará e com isto estejam sofrendo os militares e civis que cumpriram nossas ordens, se nos impôs este recurso. Fica esclarecido, assim, que visamos com a presente declaração exonerar inteiramente a corresponsabilidade no dito movimento constitucionalista a esses referidos militares e civis que seguiram a nossa orientação e atenderam às nossas determinações. Mas, além deste objetivo imediato e expresso, visamos também oferecer ao Governo uma sincera contribuição para o estudo e adoção da melhor solução para o problema que o defronta, mais relevante que o da dominação pelas armas: a pacificação, num sentido largo e profundo, que reclama todo o patriotismo, toda a clarividência do estadista. Sentimos que falta ao governo autoridade moral para nos pedir contas por um procedimento exatamente igual ao que, dois anos antes, fez esse mesmo governo alcançar o poder. Então e agora as razões do movimento foram as mesmas: o ideal da legalidade. Então e agora as razões dos dissidentes foram as mesmas: força armada. A diferença contra nós – a nossa culpa única – é que não vencemos. E uma diferença a nosso favor é que não vencemos. E uma diferença a nosso favor é que o movimento que V. Excia. chefiou, golpeou um governo legal, ao passo que o nosso visou um governo que posterga o regime da Lei. Julgamos bastante claro, para dispensar justificativa, que não nos move a pretensão de querermos nos apropriar do Movimento Constitucionalista, nem pretendemos uma diminutio capitis de nossos colaboradores, perfeitamente identificados com o móvel da nossa atuação.

Bordo do navio presídio Pedro I, 30 de outubro de 1932.

 

a) Bertholdo Klinger, Gen. de Bda.

a) Euclydes Figueiredo, Cel.

 



Chefes Militares e o Governador Pedro de Toledo



Equipe do Governador Pedro de Toledo



Fonte.

FIGUEIREDO, E. Contribuição para a História da Revolução Constitucionalista de 1932: São Paulo, Livraria Martins Editora S.A., 1954. 340p.

 

 

 

 Editado e publicado por Maria Helena de Toledo Silveira Melo.

02/10/2020.


DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA.

  Os homens de cor e a causa sagrada do Brasil   Os patriotas pretos estão se arregimentando – Já seguiram vários batalhões – O entusias...